Centro Virtual Camões - Camões IP http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia-dp3.html Mon, 23 Jun 2025 10:09:40 +0000 Joomla! - Open Source Content Management pt-pt naoresponder.plataforma.cvc@fbapps.pt (Centro Virtual Camões) Vitorino Nemésio http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/vitorino-nemesio-dp3.html http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/vitorino-nemesio-dp3.html Vitorino Nemésio (1901-1978)

Vitorino Nemésio


Foi professor da Faculdade de Letras de Lisboa e ensaísta reputado, mas o seu prestígio na nossa história literária advém-lhe sobretudo do romance açoriano Mau Tempo no Canal, 1944, história de amor e de sinuosidades familiares e sociais, e dos vários livros de poesia que o consagram como um dos grandes líricos do nosso século (O Verbo e a Morte, 1959, Sapateia Açoriana, Andamento Holandês e Outros Poemas, 1976), que equaciona o sentido da existência humana perante os diversos conflitos que a centram: o sagrado e o profano, o saber e a ingenuidade, a cultura e a natureza, o amor excessivo e os desapegos da banalidade quotidiana.

Ilha de S. Miguel, Açores
Ilha de S. Miguel, Açores

«O Futuro Perfeito»

A neta explora-me os dentes.
Penteia-me como quem carda.
Terra da sua experiência,
Meu rosto diverte-a, parda
Imagem dada à inocência.

E tira, tira puxando
Coisas de mim, divertida.
Assim me vai transformando
Em tempo de sua vida.

O Verbo e a Morte

© Instituto Camões, 2001
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luis.morgado@instituto-camoes.pt (Luís Morgado) Autores e antologia Thu, 10 Feb 2011 16:39:49 +0000
Vergílio Ferreira http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/vergilio-ferreira-dp4.html http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/vergilio-ferreira-dp4.html Vergílio Ferreira (1916-1996)

Vergílio Ferreira


Notabilizou-se como romancista e ensaísta (Espaço do Invisível, 1965, Invocação ao Meu Corpo, 1969), tendo os seus romances de início sofrido a  influência neorrealista (O Caminho Fica Longe, 1943), para prosseguirem no sentido do existencialismo de Sartre e Heiddeger (Mudança, 1949, Aparição, 1959).

Simultaneamente lírico e de libelos violentos em relação à sua contemporaneidade, exerce uma reflexão sobre o tempo, romanesco e existencial, que orienta para a valorização da vida (Alegria Breve, 1965), para o protesto em relação a todas as acomodações políticas e sociais (Signo Sinal, 1979) ou para a perceção da articulação entre os opostos do ser humano no seu decurso (morte/vida, beleza/fealdade, sagrado/profano, criação/destruição), em torno das noções da sua existência e do seu limiar (Até ao Fim, 1987, Em Nome da Terra, 1990).

Desenho de Mário Eloy
Desenho de Mário Eloy [1900-1951]

Estou só - estás só. Não penses. Não fales. És em ti apenas o máximo de ti. Qualquer coisa mais alta do que tu te assumiu e rejeitou como a árvore que se poda para crescer. Que te dá pensares-te o ramo que se suprimiu? A árvore existe e continua para fora da tua acidentalidade suprimida. O que te distingue e oprime é o pensamento que a pedra não tem para se executar como pedra. E as estrelas, e os animais. Funda aí a tua grandeza se quiseres, mas que reconheças e aceites a grandeza que te excede.

Para Sempre



© Instituto Camões, 2001

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luis.morgado@instituto-camoes.pt (Luís Morgado) Autores e antologia Thu, 10 Feb 2011 16:34:47 +0000
Urbano Tavares Rodrigues http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/urbano-tavares-rodrigues-dp2.html http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/urbano-tavares-rodrigues-dp2.html Urbano Tavares Rodrigues Urbano Tavares Rodrigues (1923) escreve regularmente desde os anos cinquenta, durante os quais se revelou como contista talentoso (Uma Pedrada no Charco, 1958) e como romancista recetivo ao estado da sociedade contemporânea e à evolução da escrita literária (ex. Bastardos do Sol, 1959, e A Hora da Incerteza, 1995). O amor, a intervenção social e política, a cidade de Lisboa e a região do Alentejo são os seus temas dominantes, cuja natureza e circunstância persegue com insistência e insatisfação:

Almoço (a Adriana está a reaprender as comidas alentejanas) uma fabulosa sopa de beldroegas com queijo e ovo escalfado. É a minha infância que regressa, quase intacta, nesse sabor. Os cílios da minha irmã a baterem muito, interrogativos e indignados, quando lhe roubo do prato, à sorrelfa, o bocado de queijo de ovelha, delicioso, que de direito, direitíssimo, lhe cabia. Já está com lágrimas nos doces olhos castanhos e eu, repeso, de colher no ar, a querer-lhe restituir o objecto da sua mágoa.

A Hora da Incerteza

© Instituto Camões, 2001

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luis.morgado@instituto-camoes.pt (Luís Morgado) Autores e antologia Thu, 10 Feb 2011 16:31:51 +0000
Sophia de Mello Breyner Andresen http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/sophia-de-mello-breyner-andresen.html http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/sophia-de-mello-breyner-andresen.html Sophia de Mello Breyner Andresen


Em Arte Poética II, Sophia de Mello Breyner Andresen (n. 1919) escreve:


A poesia é a minha explicação com o universo, a minha convivência com as coisas, a minha participação no real, o meu encontro com as vozes e as imagens. Por isso o poema não fala duma vida ideal mas duma vida concreta: ângulo da janela, ressonância das ruas, das cidades e dos quartos, sombra dos muros, aparição dos rostos, silêncio, distância e brilho das estrelas, respiração da noite, perfume da tília e do orégão.


Para Sophia, a poesia é, pois, encontro do ser com o concreto do mundo, e repare-se como, explicitando o que para si é a poesia, a autora insensivelmente já está a fazer poesia, comunicando a sua perceção das coisas através da transfiguração da palavra poética.

Publica livros desde 1944 (também prosa de ficção, e livros para crianças como A Menina do Mar e A Fada Oriana, 1958), e um dos seus grandes temas é o mar, com a luminosidade de conhecimento solar e a regularidade de reconstrução do movimento, ou respiração vital, que ele comunica, ou mesmo na epifania do mundo. Em Dia do Mar (1947), «Navegação»:


Distância da distância derivada
Aparição do mundo: a terra escorre
Pelos olhos que a vêem revelada.
E atrás um outro longe imenso morre.


Muito sensível às implicações culturais da política e do sentimento da liberdade, exprime por vezes a pequenez dos ambientes que a opressão social sufoca. Em Livro Sexto (1962), «Exílio»:


Quando a pátria que temos não a temos
Perdida por silêncio e por renúncia
Até a voz do mar se torna exílio
E a luz que nos rodeia é como grades.

© Instituto Camões, 2001

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luis.morgado@instituto-camoes.pt (Luís Morgado) Autores e antologia Thu, 10 Feb 2011 16:26:52 +0000
Raul Brandão http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/raul-brandao-dp3.html http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/raul-brandao-dp3.html Raul Brandão (1867-1930)

Raul Brandão



Esboço da Casa do Alto
Esboço da Casa do Alto

É o grande modernista português na prosa de ficção, integrando uma dimensão simbolista de tentativa de transposição de uma realidade aparente e decetiva para obter uma transcendência ou absoluto que a escrita tacteantemente formula.

Ficcionista de personagens patéticas e grotescas na incapacidade de delinearem o seu sonho ou infames no modo de o trair (A Farsa, 1903, Os Pobres, 1906), é no romance Húmus, 1917, que melhor explora a dimensão larvar da pequenez humana, encenando a tragédia da luta da «vila» pelo seu «sonho», e utilizando processos de desconjuntamento do tempo narrativo que antecipam o trabalho discursivo da ficção de hoje. Na mesma linha compôs várias peças de teatro.

Ouço sempre o mesmo ruído de morte que devagar rói e persiste...

Uma vila encardida - ruas desertas - pátios de lajes soerguidas pelo único esforço da erva - o castelo - restos intactos de muralha que não têm serventia. Uma escada encravada nos alvéolos das paredes não conduz a nenhures. Só uma figueira brava conseguiu meter-se nos interstícios das pedras e delas extrai suco e vida. (... ) Sobre isto um tom denegrido e uniforme: a humidade entranhou-se na pedra, o sol entranhou-se na humidade. (... )

Silêncio. (...) Ouço sempre o trabalho persistente do caruncho que rói há séculos na madeira e nas almas.

Húmus

© Instituto Camões, 2001

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luis.morgado@instituto-camoes.pt (Luís Morgado) Autores e antologia Thu, 10 Feb 2011 16:24:07 +0000
Nuno Bragança http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/nuno-braganca-dp2.html http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/nuno-braganca-dp2.html Nuno Bragança (1929-1985)

Nuno Bragança


Publicou um livro decisivo para a nossa modernidade literária, A Noite e o Riso, 1969, que alia a experiência surrealista a certas tendências do «nouveau roman» francês, desenvolvendo uma experiência pessoal de educação e boémia.

Notabilizou-se como romancista (Square Tolstoi, 1981) e como contista (Estação, póstumo), tematizando a inquietação humana através da deambulação urbana, política, militante e erótica, e insistindo na componente social da desarticulação íntima dos valores e dos sentimentos.


Estou sentado num dancing e tenho a mão. Ainda em volta de uma bebida de pressão de ar.

Às vezes, acontece num sítio destes e em hora assim que o pecado original se derreteu num shaker, acabando-se a mortalidade infantil e a Polícia. Sinto essa harmonia. Por cima dos ombros cansados, como um xaile da leveza dum suspiro de gato. Pelas luzes das mesas e fumo nos olhos trotam as mais certeiras notas de piano.

A Noite e o Riso (excerto)

© Instituto Camões, 2001

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luis.morgado@instituto-camoes.pt (Luís Morgado) Autores e antologia Thu, 10 Feb 2011 16:21:46 +0000
Miguel Torga http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/miguel-torga-dp2.html http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/miguel-torga-dp2.html Miguel Torga (1907-1995)

Miguel Torga


Médico em Coimbra, foi um polígrafo fecundíssimo e figura determinante na cultura portuguesa deste século, em termos não só literários mas também cívicos.

Tangencial às tendências estéticas e ideológicas contemporâneas, desenvolveu um estilo muito pessoal na poesia (O Outro Livro de Job, 1936), na ficção (em notáveis antologias de contos, ex. Bichos) e noutros géneros, onde se destacam os 16 volumes do Diário, obra-prima das letras portuguesas.

Muito sensível ao enraizamento do ser humano no seu meio ambiente, nomeadamente na montanha, encara a relação do homem com o mundo, em luta ou harmonia, num reconhecimento da dimensão cósmica que sublinha também a vertente sagrada da existência.

Miguel Torga, Bichos
Miguel Torga, Bichos, 18.ª edição, Coimbra, 19

«Solidão Criadora»

Dorme e sonha a meu lado
Tão alheia de mim
Que me sinto um amante abandonado...
Acordá-la?
Gritar?
O poeta é uma angústia que se cala
A cantar.

Diário - V




© Instituto Camões, 2001

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luis.morgado@instituto-camoes.pt (Luís Morgado) Autores e antologia Thu, 10 Feb 2011 16:18:10 +0000
Mário de Sá-Carneiro http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/mario-de-sa-carneiro-dp3.html http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/mario-de-sa-carneiro-dp3.html Mário de Sá-Carneiro (1890-1916)

Mário de Sá-Carneiro


É um dos nossos maiores poetas do Modernismo, talvez o que melhor exprime a cisão do sujeito na enunciação de si próprio e na formulação da sua perceção do mundo, ora decetiva ao jeito simbolista-decadentista, ora inebriada pelas sensações e entusiasmos do futurismo.

"Cristo Vermelho", de Amadeo de Souza-Cardoso
"Cristo Vermelho", de Amadeo de Souza-Cardoso [1887-1918]

A sua poética afasta-se de uma preocupação meramente formal da experiência literária, centrando nela embora o seu discurso, mas nela fundamentando as interrogações e a afirmação de anseios que dão sentido a uma existência que no entanto as não encontra. O poeta põe termo aos seus dias, suicidando-se em Paris.


Perdi-me dentro de mim
Porque eu era labirinto,
E hoje, quando me sinto,
É com saudades de mim.

Passei pela minha vida
Um astro doido a sonhar.
Na ânsia de ultrapassar,
Nem dei pela minha vida... (...)

Desceu-me n'alma o crepúsculo;
Eu fui alguém que passou.
Serei, mas já não me sou;
Não vivo, durmo o crepúsculo.

«Dispersão»

© Instituto Camões, 2001

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luis.morgado@instituto-camoes.pt (Luís Morgado) Autores e antologia Thu, 10 Feb 2011 16:15:00 +0000
Mário Cláudio http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/mario-claudio-dp4.html http://cvc.instituto-camoes.pt/autores-e-antologia/mario-claudio-dp4.html Mário Cláudio


Mário Cláudio (1941), firmando-se de início como poeta e cultivando vários géneros literários, é sobretudo conhecido como ficcionista desde a publicação de Um Verão Assim, 1974, reafirmando-se com Damascena, 1983, e sendo reconhecido como um dos grandes vultos da ficção portuguesa contemporânea a partir da sua Trilogia da Mão (com volumes sobre Amadeo Souza-Cardoso, Guilhermina Suggia e Rosa Ramalho). O pendor para as formas literárias de reconstituição, aliando a capacidade de evocação de ambientes e figuras a uma muito pessoal subjetividade de deformação criativa, acentua-se em muitas das suas obras posteriores, como A Quinta das Virtudes, 1990, ou As Batalhas do Caia, 1995.


Fora Cândida Branca fruto de certo romance, fugacíssimo e intenso, entre um cocheiro de mala-posta, casado e pai de outras duas raparigas, e uma vendedeira de doces, da aldeia de Irivo, no fojo de Penafiel. Haviam-se avistado seus progenitores, na romaria da Senhora Aparecida, por uma longa jornada ardente, dessas que fazem desfalecer os próprios milheirais. E, no meio das espigas, engendrara-se a pequena, crescendo à sombra, depois, da doceira, a qual acharia, mais tarde, um rapaz de quinta, disposto a recebê-la, por consorte.

A Quinta das Virtudes

© Instituto Camões, 2001

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luis.morgado@instituto-camoes.pt (Luís Morgado) Autores e antologia Thu, 10 Feb 2011 15:59:41 +0000