Gibraltar, Estreito de
Conhecido pelos gregos como os “Pilares de Hércules” foram, no entanto, os árabes a vulgarizar o nome pelo qual é hoje conhecido Gibraltar. Resulta o topónimo da corrupção do nome árabe “Jabel Tarik” (a Montanha de Tarik), concedido ao local em honra de Tarik-ibn-Zeyad que primeiro ocupou a área no seguimento da conquista árabe da Península Ibérica. O Estreito de Gibraltar é, ainda hoje, um local estratégico na ligação de dois mares: o Atlântico e o Mediterrâneo. A actividade marítima entre Portugal e o Norte de África é uma realidade desde muito cedo com os primeiros ecos no século XIII. Esta é a altura em que Luís Adão da Fonseca define como a da "abertura do Estreito".
No século XVI a pirataria na área cresce na exacta medida em que os centros de apoio se multiplicam e a Tetuão se juntam Larache, Salé, Argel, Tunes ou Tripoli e as rotas comerciais se diversificam. Por esta zona passava um comércio avultado entre as costas de Itália, Sicília e Espanha e a Europa do Norte, tornando-o num alvo apetecível para piratas.. Após a conquista de Ceuta e com a extensão da presença portuguesa no século XV e inícios do XVI estas rotas alargaram-se e caíram quase todas nas mãos de cristãos o que obrigou as comunidades árabes e berberes a intensificar a pirataria como forma de quebrarem o bloqueio nas costas magrebinas. Também os portugueses vão tornar mais constantes os seus ataques, em especial ao reino de Fez. Por esta altura surge no Mediterrâneo Ocidental um novo adversário temido e conhecedor das tácticas e técnicas portuguesas: os Turcos. Estes vão tornar-se um precioso auxílio para os piratas locais trazendo navios maiores e uma outra dinâmica à guerra de corso.
Em 1517 o célebre corsário turco Barba Roxa percorre o Estreito com catorze navios de remos. Contra esta armada envia o Rei de Castela uma poderosa frota que no entanto não consegue capturar o famoso pirata turco. Este divide os navios, indo parte para Larache e outra para Argel. A intervenção espanhola e esta fuga para Larache vão assumir uma importância fundamental no desenrolar da actividade marítima da região. A primeira vem dar consistência às crescentes preocupações dos monarcas espanhóis para com a segurança das suas costas. O segundo facto transformou Larache num grande porto de piratas que em muito prejudicaram as ligações de Portugal com o Norte de África. Toda esta actividade corsária terá sido um dos motivos que levou D. Manuel a prover esta região com uma armada permanente. É a partir da sua criação oficial, em 1520, que a actividade naval portuguesa toma foros mais consistentes.
D. João III altera todos estes parâmetros impondo uma nova política Ultramarina que passava pelo "desinvestimento", abandonando as praças mas também na constatação de que um país como Portugal não poderia manter a mesma estrutura imperial, expansionista e em crescimento em três continentes diferentes (Ásia, África e América). Essa constatação levou o monarca português a conservar no Norte de África as praças indispensáveis à segurança do Estreito ao mesmo tempo que aliciava Carlos V a intervir mais directamente nesta missão, pedindo-lhe que enviasse forças navais para a zona. No ano de 1552 um assento régio define a constituição e alcance das diversas armadas. Portugal recua a sua armada para o Algarve podendo eventualmente fazê-la rumar até Gibraltar. Consegue mesmo que a responsabilidade directa dessa defesa passe para a parte espanhola. Estava consumado o recuo necessário que fez com que os portugueses apenas se preocupassem directamente com esta área quando as suas praças eram ameaçadas.
Rui Godinho
Bibliografia
FONSECA, Luís Adão da, Navegacion y Corso en el Mediterraneo Ocidental. Los Portugueses a medianos del Siglo XV, Pamplona, Universidad de Navarra,1978.
GODINHO, Rui Landeiro, “A Armada do Estreito de Gibraltar no século XVI”, Actas do Colóquio Vasco da Gama os Oceanos e o Futuro. Escola Naval, 23 a 27 de Novembro de 1998, [s.l.], Escola Naval , 1999, pp.182-190.
GUERREIRO, Luís R., O Grande Livro da Pirataria e do Corso, [Lisboa], Círculo de Leitores, imp.1996.
RODRIGUES, Bernardo, Anais de Arzila, Ed. David Lopes, Vol. I, Lisboa, Academia de Ciências de Lisboa, 1915.