Manuel José Nogueira Valadares é um dos nossos maiores cientistas. E há muitos que o consideram o físico português mais importante do seu tempo. Nasceu em Lisboa em 26 de Fevereiro de 1904 e entusiasmou-se cedo pela ciência. Estudou Físico-Químicas na Faculdade de Ciências de Lisboa, foi professor do liceu Pedro Nunes e Assistente no Instituto Português de Oncologia. Em 1927, foi contratado pela sua Faculdade como Assistente. Dedicou-se a partir daí à investigação e ao ensino, em exclusividade real.

Entre 1929 e 1930, estagiou no Instituto de Rádio, em Genebra. Entre 1930 e 1933 trabalhou em Paris, onde se doutorou sob a orientação de Madame Curie. Regressado ao país, vinha com a convicção de ser «preciso criar entre nós a investigação científica no domínio da Física», como ele próprio referiu numa carta a Ruy Luís Gomes. «Ela nunca tinha existido entre nós», prossegue na mesma carta, «aparte alguns casos esporádicos e realizados mais com o objectivo de satisfazer imposições legais do que como consequência de um desejo, de uma actividade cultural.»

Manuel Valadares teve a sorte de ter o apoio entusiástico do Prof. Cyrillo Soares (1883–1950), «uma personalidade rara», conforme o referiu Bragança Gil, um homem que não foi um investigador, mas que soube «rodear-se de um conjunto de colaboradores de modo a criar uma autêntica escola de investigação em Física». Nomeado director do laboratório de Física da Faculdade de Ciências de Lisboa, Cyrillo Soares soube imprimir ao grupo uma orientação científica acertada.

Manuel Valadares foi dos que não desiludiram as esperanças em si depositadas. Com iniciativa e recorrendo frequentemente a material improvisado ou emprestado, conseguiu iniciar a investigação em espectrografia de raios X, esclarecendo vários problemas de física atómica então em aberto. Nos anos que se seguiram, em conjunto com Marques da Silva (1905–1965) e Armando Gilbert (1914–1985), a que se vieram a juntar investigadores mais jovens, como Lídia Salgueiro, o Laboratório de Física colocou-se pouco a pouco no mapa da ciência, aparecendo os resultados das suas pesquisas publicados nas melhores revistas internacionais.

Com Cyrillo Soares, Telles Antunes e Marques da Silva, foi fundador de Portugaliae Physica, que nasceu em 1943 e durante anos teve uma variada contribuição internacional. Mais tarde, colaborou esporadicamente na Gazeta de Física (fundada por Armando Gibert), que ainda hoje se publica.

Em 1947, contudo, o governo desferiu um golpe nas universidades portuguesas, afastando por desconfiança política muitos dos professores e investigadores mais activos. O Laboratório viu-se roubado da contribuição de Valadares, de Marques da Silva e de Gilbert. Cyrillo Soares reformou-se, abatido pelo brutal golpe e magoado com a falta de solidariedade de outros professores da Faculdade.

Manuel Valadares, na altura com 43 anos, tinha uma reputação científica sólida e recebeu um convite de Irène Joliot-Curie para ir para Paris como «Chargé de recherches» — em Portugal, não tinha chegado ainda à posição de professor. Rapidamente progrediu na carreira, tornando-se «Maître» e depois «Directeur de Recherches». Aí viveu alguns dos seus anos mais produtivos, tendo sido nomeado director do Centro de Espectrometria Nuclear e de Massa do C.N.R.S.

Mesmo em Paris, Valadares continuou a fomentar a investigação científica em Portugal, contribuindo com ideias e mantendo-se disponível para apoiar os investigadores portugueses — foi co-orientador do doutoramento de José Gomes Ferreira.

Personalidade versátil, Manuel Valadares foi ainda um orador brilhante e um pedagogo que sabia transmitir aos seus alunos o entusiasmo pela ciência — conta-se que as suas aulas eram por vezes interrompidas com aplausos. Nos tempos livres dedicava-se à aguarela — «uma das minhas maiores distracções» — tendo algumas trabalhos premiados. Interessou-se pela aplicação de métodos científicos ao estudo da arte e dirigiu brevemente um laboratório pioneiro, anexo ao Museu Nacional de Arte Antiga, onde iniciou colaboradores no estudo de pinturas por radiografia.

Portugal condecorou-o em 1979 com o Grau de Grande Oficial da Ordem Militar de Sant’Iago da Espada. Manuel Valadares viria a morrer três anos mais tarde, em 31 de Outubro de 1982, em Paris, com 79 anos de idade. O seu nome é recordado com o «Anfiteatro Manuel Valadares», hoje incluído no Museu de Ciência, situado no velho edifício da Escola Politécnica. O seu nome está num dos muros a que, dizia, estava ligado por «mais de um quarto de século» e por «tanta, tanta recordação inolvidável».