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Anabela Ramos
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Helmut R. Malonek
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Portugal na fundação da União Matemática Internacional
A história da IMU começa em 1918, ainda antes da primeira guerra mundial ter acabado. Nessa altura ocorreram discussões entre França, Inglaterra e Estados Unidos no sentido de estabelecer uma nova cooperação internacional em ciência, mais alargada do que antes. Ficou decidido que as nações aliadas deveriam formar novos organismos científicos, com a eventual participação de países não aliados. The International Research Council (IRC), fundado em 1919, foi criado precisamente com esse objectivo, em substituição da Associação Internacional das Academias Científicas (IAA), que tinha sido criada em 1899. [1]
Relativamente à IMU, foi em Julho de 1918, numa conferência realizada em Bruxelas, que foi elaborado um projecto de estatutos provisório, bem como formada uma comissão executiva (Bureau), também provisória. É de realçar que, nesta conferência, participaram delegados representantes da Bélgica, Canadá, E.U.A., França, Grã-Bretanha, Irlanda, Itália, Japão, Nova Zelândia, Polónia, Portugal, Roménia e Sérvia.[2]
Foi, no entanto, dois dias antes do início do Congresso de Estrasburgo (o sexto ICM e primeiro depois da guerra), a 20 de Setembro de 1920, com a presença dos delegados da Inglaterra, França, Bélgica, E.U.A., Itália, Checoslováquia, Grécia, Portugal, Roménia, Japão e Polónia, que ocorreu a primeira Assembleia-Geral da IMU. Os estatutos foram aprovados e constituído o Bureau definitivo. [2] Estes estatutos foram dados a conhecer em Portugal no nº 67, pág. 612-616, da revista O Instituto.
O representante português foi Francisco Miranda da Costa Lobo, Presidente do Instituto de Coimbra e director do Observatório de Coimbra. Ele próprio escreve no mesmo número da revista O Instituto, o seguinte:
Tive a honra de tomar parte nestas deliberações como representante do Govêrno Português, nomeado por portaria de 26 de Agosto de 1920, e aqui tenho a satisfação de manifestar aos Ex.mos Srs Rego Chagas e Queiroz Veloso o meu agradecimento pelo honroso encargo de que fui incumbido.
No artigo, IMU - Past and Present [1], podemos ler que nesta Assembleia-Geral foi tomada uma importante decisão política: delegados de países ex-inimigos ou, mais explicitamente, da Alemanha, Áustria, Hungria e Bulgária foram proibidos de serem membros da IMU. Ficou decidido, no entanto, convidar países não alinhados a integrarem a União.
O professor Charles de la Vallé Poussin, da Bélgica, foi eleito primeiro Presidente da IMU por quatro anos e o professor G. Koenigs, de França, foi eleito Secretário-Geral, por um período de oito anos.
De acordo com os estatutos, era à IMU que competia determinar o lugar e a data de cada ICM e somente matemáticos de países membros do IRC poderiam participar.
À sombra da grande Guerra - tempos difíceis para a IMU
A segunda Assembleia-Geral da IMU, bem como o ICM seguinte, ocorreu em Toronto em 1924 com a presença de Francisco Miranda da Costa Lobo e Fernando de Vasconcelos. Os organizadores canadianos não permitiram a participação de matemáticos dos países ex-inimigos. No entanto, os estatutos não foram totalmente cumpridos ao aceitarem a participação de delegados da Rússia, Ucrânia, Geórgia, Índia e Espanha, países que não eram membros do IRC.
A Assembleia-Geral elegeu o professor Salvatore Pincherle, de Itália, como novo Presidente da União. Passado pouco tempo, Pincherle e Koenigs entraram em rota de colisão sobre a política a seguir no ICM de 1928, relativamente à participação desses países ex-inimigos.
Na Assembleia do IRC de 1925 muitas sugestões foram dadas no sentido de acabar com essas restrições. As propostas foram bem acolhidas, mas não o suficiente para alterar os estatutos.
Passado um ano, numa assembleia extraordinária do IRC, foi decidido convidar a Alemanha, Áustria, Hungria e Bulgária para integrarem o IRC e as Uniões associadas.
No ICM de 1928, que ocorreu em Bolonha, Pincherle e os outros organizadores italianos decidiram retomar as tradições anteriores à guerra ao convidarem a participar no Congresso todos os matemáticos, independentemente da sua nacionalidade.
É de constatar que, na organização dos congressos, antes da Primeira Guerra Mundial, a cooperação activa dos matemáticos alemães (entre eles G. Cantor e D. Hilbert) e matemáticos franceses (por exemplo Poincaré) era decisiva e de grande influência para o desenvolvimento da matemática, no início do século XX. Lembramos apenas, o papel dos famosos vinte e três problemas de Hilbert, dados a conhecer no segundo ICM de 1900, em Paris.
O Secretário-Geral da IMU, Koenigs, revelou que era contra esta abertura e afirmou que o Congresso de Bolonha não devia ser considerado um Congresso da União, uma vez que os estatutos ainda não tinham sido alterados. Esta tomada de posição contradiz a sua atitude anterior, porque também ele tinha permitido, em 1924, a participação de países que não eram membros do IRC. Mas vozes de diversas Nações, nomeadamente da Grã-Bretanha e EUA, fizeram saber que só participariam no Congresso se este fosse verdadeiramente internacional, sem quaisquer limitações.
O ICM de Bolonha foi o maior até então e, cientificamente, um sucesso. Além disso, a Assembleia-Geral da IMU, que ocorreu durante o Congresso, aprovou unanimemente a política de Pincherle. Mas a sombra das rivalidades políticas, em particular a crescente agressividade da Alemanha, complicou a escolha do país onde devia ocorrer o congresso seguinte, em 1932. Foi apenas, a oferta da Suíça, representada pelo Presidente da Sociedade dos Matemáticos Rudolf Fueter, de Zurique, que desbloqueou a situação.
Os estatutos da IMU expiraram em 1931, simultaneamente com os do IRC. Novo projecto de estatutos devia ser preparado antes da Assembleia-Geral de 1932. No entanto, nesta Assembleia, foi proposta uma comissão que devia estudar a desejável continuidade de uma organização matemática internacional e apresentar o respectivo relatório no ICM seguinte, que se realizou em Oslo, em 1936. Durante este período a IMU foi suspensa. Depois de um primeiro esforço para recomeçar a União nos anos trinta ter falhado, esse trabalho recomeçou pouco depois da segunda guerra mundial ter terminado. O renascimento da IMU formalizou-se em 1951. A primeira Assembleia-Geral da nova IMU ocorreu em 1952 e, desta vez, com a presença de matemáticos alemães. Também Portugal esteve presente, representado pelo Professor J. Sebastião e Silva.
Mas nesta altura, Portugal já não seguiu a política de abertura internacional. É bem conhecido que o regime salazarista tinha iniciado uma ofensiva contra a Universidade Portuguesa, nos anos de 1946 e 1947. [3]
Anabela Ramos e Helmuth R. Malonek
Referências
[1] Olli Lehto, IMU-Past and Present,
http://www.mathunion.org/Publications/Bulletins/39/past+present.html
[2] Lobo, Francisco Miranda da Costa, O Instituto, Imprensa da Universidade, Coimbra, nºs 67 e 71.
[3] Morgado, José, Ofensiva Governamental contra a Universidade Portuguesa, 1990,
http://www.mat.uc.pt/~jaimecs/hspm/X0039_capIV14.html