Francisco Garção Stockler (1759-1829)



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Francisco de Borja Garção Stockler nasceu em Lisboa em 25 de Setembro de 1759, filho de Christiano Stockler e de Margarida Josepha Rita d’Orgiens Garção de Carvalho. Morreu em Tavira em 6 de Março de 1829.

Em 1783, Francisco Stockler concluiu os estudos de matemática na Academia Real de Marinha, passando de seguida à Universidade de Coimbra. Obteve o grau de bacharel em matemática e seguiu a carreira militar, tendo chegado ao posto de tenente general do exército português.

A 20 de Outubro de 1787 foi eleito sócio da Academia Real das Ciências, tendo passado a sócio efectivo de Matemática em 30 de Janeiro de 1789. Em 1798 passou a ser secretário da Academia.

A partir de 1800 Stockler deixou de ter um papel activo na Academia Real de Marinha, de onde acabou por ser excluído, ao mesmo tempo que foi afastado dos cargos que desempenhava no exército, em virtude do seu desempenho na Guerra das Laranjas, entre Portugal e Espanha e da queda em desgraça do seu protector, o Duque de Lafões.

A importância política de Stockler viria a ser afectada em particular com as invasões francesas, na sequência das quais foi acusado de afrancesado e de colaborar com os invasores. Estas acusações estariam relacionadas com o facto de Stockler ter alegadamente recebido Junot com todas as honras e de lhe ter oferecido a presidência da Academia das Ciências, bem como o estatuto de sócio honorário.

A imagem de Stockler foi profundamente afectada pela opinião escrita de Acúrsio das Neves, que o apelidou de “traidor”, na sua História Geral da Invasão dos Franceses em Portugal. Stockler tentaria repetidamente defender-se publicamente, nomeadamente através das Academia das Ciências, mas as suas pretensões foram sempre recusadas. Tendo caído em desgraça, decidiu-se pela partida para o Rio de Janeiro, em 1812, onde foi pedir o apoio de D. João VI para recuperar o seu estatuto e funções.

Viria a integrar a lista de sócios efectivos da Academia Real das Ciências, no Rio de Janeiro, na classe das ciências exactas. Em 1819 seria nomeado Presidente interino da Junta da Direcção da Academia Militar do Rio de Janeiro.Foi também nomeado sócio da Royal Society de Londres. Nesse mesmo ano foi encarregado por D. João VI de elaborar um plano de defesa da capitania do Rio de Janeiro.

Em 1820 regressou do Brasil, tendo sido nomeado governador dos Açores, com o posto de capitão-general. Com a vitória do movimento liberal em Portugal, viria a manifestar o seu incondicional apoio à família real, o que lhe valeria a prisão, em 1821. Viria a ser libertado em 1823, tendo recuperado todos os seus direitos políticos, e passando a integrar o Tribunal do Conselho Ultramarino.

Foi ainda comendador da Ordem de Cristo, fidalgo da Casa Real, cavaleiro da Torre e Espada, secretário das imediatas resoluções do Rei relativas ao exército, membro da Junta do Código Criminal Militar, membro da Junta convocada em 1823 para organizar o processo da Constituição, governador das armas na província do Algarve e finalmente barão da Vila da Praia.


Actividade científica

Stockler fez inicialmente algum trabalho de investigação histórica com Correia da Serra, sobre a vida e obra de Pedro Nunes. A maior parte dos seus estudos científicos foi realizada entre 1789 e 1797, período em que apresentou à Academia das Ciências várias memórias de matemática sobre o método das fluxões.

Foi docente da Academia Real da Marinha, onde passou a lente proprietário da cadeira de Matemática do segundo ano em 1791. Elaborou então um compêndio relativo ao método das fluxões. A partir de 1793, Stockler empenhou-se num processo de reforma do ensino, tendo por objectivo a especialização funcional em torno da actividade comercial e financeira. Pretendia criar uma escola destinada à formação especializada para deputados da Real Junta do Comércio, conselheiros da Real Fazenda, contadores, tesoureiros e fiscais do erário régio.

Elaborou um plano para a criação da “Escola Politico-mercantil”, plano que foi aprovado, tendo Stockler sido nomeado responsável pelo processo de elaboração dos compêndios. Chegou a encomendar um compêndio a José Maria Dantas, Compêndio de Aritmética Universal, que foi impresso em 1798, mas o projecto desta escola político-mercantil não teve continuidade e Stockler continuou o seu trabalho docente na Academia de Marinha.

Depois de ter caído em desgraça junto dos responsáveis políticos, foi afastado da Academia Real de Marinha e de cargos relevantes no exército, tendo-se empenhado num processo de reabilitação pessoal e política. No Brasil a partir de 1812, viu recusada pela Academia das Ciências a memória “Methodo Inverso dos Limites, ou Desenvolvimento Geral das Funções Algorithmicas”, que viria a fazer publicar em 1824.

A obra mais conhecida de Stockler é o Ensaio historico sobre a origem e progressos das mathematicas em Portugal. Segundo Gomes Teixeira [Inserir link para personagem já existente], “Stockler foi ao mesmo tempo historiador dentro das Matemáticas e cultor hábil da Análise.” (História das Matemáticas em Portugal, pp. 233-225).

Ainda segundo Gomes Teixeira, “Como analista, legou-nos Stockler, além de dois trabalhos didácticos sobre a doutrina dos limites e dos infinitamente pequenos, cuidadosamente redigidos sob o ponto de vista lógico, quatro memórias publicadas nas colecções da Academia das Ciências de Lisboa, nas quais se nota muita sabedoria e notável engenho, mas falta de rigor no emprego das séries. Mas este defeito não é estranhável, porque a doutrina deste algoritmo estava ainda no seu tempo em estado muito vago e o mesmo defeito se encontra em escritos de grandes geómetras estrangeiros do mesmo tempo” (História das Matemáticas em Portugal, p. 271).


Principais Publicações

Elogio Histórico de João Rond D’Alembert, pronunciado na Academia Real das Sciencias de Lisboa, Lisboa, Officina da Academia, 1791.
Compendio da Theorica dos Limites, ou Introducção ao Methodo das Fluxões, Lisboa, Academia R. das Ciências de Lisboa, 1794.
“Memoria sobre os verdadeiros principios do Methodo das Fluxões”, Memorias da Academia Real das Sciencias de Lisboa, tomo I, 1797, pp. 200-217.
“Demonstração do Theorema de Newton sobre a relação, que tem os coefficientes de qualquer equação algébrica com as sommas das potencias das suas raizes, e applicação do mesmo Theorema ao desenvolvimento em serie dos productos compostos de infinitos factores”, in Memorias de Mathematica e Phisica da Academia Real as Sciencias de Lisboa, tomo II, 1799, pp. 1-46.
“Memoria Sobre algumas propriedades dos Coefficientes dos termos do Binómio Newtoniano”, Memorias de Mathematica e Phisica da Academia Real das Sciencias de Lisboa, tomo II, 1799, pp. 480-511.
Lettre a M. Le Redacteur du Monthly Review ou Réponse aux Objections qu’on a faites dans ce journal à la methode des limites de fluxions hypothétiques, à Lisbonne, de l’Imprimerie de l’Académie Royale des Sciences, 1800.
Obras, tomo I, Lisboa, Academia das Sciencias, 1805; tomo II, Lisboa, Typ. Silviana, 1826.
Lição duodécima dos elementos de geometria filosófica, Lisboa, Imprensa Régia, 1819.
“Memoria Sobre as Equações de condição das Funcções Fluxionaes”, Memorias de Mathematica e Phisica da Academia Real das Sciencias de Lisboa, tomo II, 1799, pp. 196-295.
Ensaio sobre a Origem e Progressos das Mathematicas em Portugal, Paris, Officina de P. N. Rougeron, 1819.
Methodo Inverso dos Limites, ou Desenvolvimento Geral das Funções Algorithmicas…, Lisboa, Typogrpahia de Thaddeo Ferreira, 1824.
Elogio de José Joaquim Soares de Barros e Vasconcellos, com notas de António de Portugal Faria, Leorne, Typographia de Raphael Giusti, 1897.


Fernando Reis




Bibliografia


CALBUQUERQUE, Luís de, “Stockler, Francisco de Boraça Garção”, SERRÃO, Joel (dir.), Dicionário de História de Portugal, Porto, Figueirinhas, 1981, vol. VI.
DUARTE, António Leal, CARVALHO E SILVA, Jaime, QUEIRÓ, João Filipe Algumas notas Sobre a História da Matemática em Portugal, http://www.mat.uc.pt/~jaimecs/hmp/index.html
HONÓRIO; Cecília, A Natureza e o Homem nos caminhos do saber e do poder: Francisco de Borja Garção Stockler (1759-1829), Lisboa, 2003 [Dissertação de Doutoramento apresentada à Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa]
GUIMARAES, Rodolfo, Les mathématiques en Portugal au XIX siécle, Coimbra, Imp. da Universidade, 1900. Versão digitalizada pela Biblioteca Nacional
TEIXEIRA; Francisco Gomes, História das Matemáticas em Portugal, Lisboa, Academia das Ciências, 1934. Versão digitalizada em História das Matemáticas em Portugal

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