Soares de Barros (1721-1793)



José Joaquim Soares de Barros e Vasconcelos, nasceu em Setúbal em 19 de Março de 1721, filho de João Soares de Brito, administrador do morgado dos Soares, de Setúbal, e de Isabel Apolónia. Casou com a sua sobrinha Maria Isabel Libania de Barros e Vasconcelos.

Seguiu a vida militar e dedicou-se inicialmente ao estudo da história profana e da língua francesa. Traduziu do francês os seguintes livros: Conjuração de Portugal, Amesterdão, 1682; Vida de Augusto Rei da Polónia, Londres, 1739; Vida de Henrique IV de França.

Aos 27 anos, por iniciativa de João Baptista Carbone, foi enviado por D. João V para Inglaterra, para onde partiu na companhia de Freire de Andrade Enserrabodes, enviado à corte de Londres. Tendo tido conhecimento da abertura de uma Escola Militar na Holanda e pretendendo estudar ciências militares, pediu autorização para se mudar para a Holanda.

Entretanto terá obtido informações de que a qualidade da Escola não seria a que desejava e pediu nova autorização ao governo português para se mudar para Paris. Perguntado pelo Ministro português da razão do seu desejo de sair de Inglaterra, terá respondido que já não tinha em Inglaterra nada para aprender.

Uma vez em Paris, travou conhecimento com o astrónomo Joseph Nicolas Delisle (1688-1768), com quem estudou Matemáticas, Astronomia e Geografia. Passou a frequentar com assiduidade o Observatório instalado por Delisle no Palácio de Cluny. Com Delisle aprendeu a manusear os instrumentos astronómicos, tendo feito um grande número de observações.
Foi eleito sócio correspondente da Academia das Ciências de Paris e da Academia Real das Ciências e Belas Letras de Berlim.

Palácio de Cluny no século XVIII com o Observatório

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Em 1755 mostrou interesse em regressar a Portugal, mas ficou em Paris, encarregado por D. José de procurar e adquirir livros. Em 1759 já teria adquirido cerca de 2000. Em 1760 veio a Lisboa, para logo de seguida regressar a França, desta vez encarregado de missões secretas. O Marquês de Pombal utilizou-o como espião na corte francesa para obter informações respeitantes à Guerra dos Sete Anos.

Foi nomeado secretário da Embaixada em Fevereiro de 1761. Regressou a Portugal em 1761, sem autorização do governo, o que lhe valeu a animosidade do Marquês de Pombal, terminando assim a sua curta carreira política. Retirou-se para Sesimbra, onde se dedicou a estudos sobre as pescas e o sal de Setúbal, nomeadamente sobre o modo de salgar o peixe e de extrair óleo das sardinhas. Fez também estudos sobre os vestígios gregos e romanos em Tróia.

Morreu em Lisboa a 3 de Novembro de 1793.


Actividade Científica

Trabalhando e vivendo junto de Delisle, Soares de Barros agiu como intermediário na correspondência que o astrónomo francês empreendeu com astrónomos portugueses. Delisle criou uma rede de correspondentes com quem trocava informações sobre observações astronómicas, em particular a propósito dos trânsitos de Mercúrio e de Vénus. O seu objectivo principal era a determinação da paralaxe solar, para assim conseguir determinar um valor fiável para a distância da Terra ao Sol.

Soares de Barros colaborou com Delisle na correspondência com os astrónomos portugueses Manuel de Campos, jesuíta, João Chevalier (1722-1801), oratoriano, e Miguel Ciera [inserir link para entrada].

Em 6 de Maio de 1753 Soares de Barros observou o trânsito de Mercúrio e fez experiências para reduzir efeitos ópticos indesejáveis ocorridos nos momentos dos contactos de Mercúrio com o Sol. Elaborou uma memória sobre estas observações e experiências, que foi lida na Academia das Ciências de Paris nas sessões de 7 e 11 de Junho, publicada por Delisle em 1753.

Em 1753 Soares de Barros tentou melhorar as observações de um trânsito de Vénus em frente ao sol, interponde novos filtros. Descreveu também a observação de efeitos ópticos indesejáveis, possivelmente provocados pelo próprio telescópio que utilizou


Nestas observações Soares de Barros fez experiências para reduzir os referidos efeitos ópticos, utilizando um vidro verde juntamente com um fumado. As experiências de Soares de Barros foram muito bem recebidas pela comunidade científica da época, que pretendia resolver os problemas do desfasamento nos registos de diferentes observadores, dos tempos dos contactos de Mercúrio com o Sol.

Observou, em 1755, a ocultação dos satélites de Júpiter, detectando a influência da extinção atmosférica nos tempos de imersão e emersão dos satélites no corpo do planeta. Neste mesmo ano publicou nas Mémoires de l’Académie Royale des Sciences de Berlin, a memória intitulada “Nouvelles équations pour la perfection de la théorie des satellites de Jupiter et pour la correction des longitudes terrestres, determinées par les observations des mêmes satellites”.

Em 6 de Junho de 1761 fez observações do Trânsito de Vénus no Mosteiro de Sta. Genoveva, em Paris, participando no esforço internacional coordenado por Delisle. Este compreendeu a recolha dos registos de observações do trânsito em diversas partes do mundo, realizado por observadores de vários países. As suas observações seriam utilizadas por Encke no séc. XIX para refinar, com o método dos mínimos quadrados, a paralaxe solar e o consequente valor da Unidade Astronómica.

Barros dedicou ainda a sua atenção ao problema da propagação do calor a partir dum corpo, o que lhe permitiu propor um novo termómetro, em 1757, nas Memórias para a História das Ciências e Belas Artes. Este termómetro não chegou a ser construído.

Em 1780 participou na primeira sessão da Academia das Ciências de Lisboa, a 4 de Julho. Na sessão preparatória de 16 de Janeiro tinha sido eleito sócio efectivo da classe de ciências. Em 21 de Junho de 1789 passou a sócio supranumerário. Apresentou uma comunicação sobre “huas novas reflexões sobre o movimento progressivo da Luz pelos espaços celestes”, na 1.ª sessão da Academia.

Leu diversas memórias maioritariamente sobre temas de economia que foram publicadas nas Memórias Económicas da Academia. Merecem também destaque os seus trabalhos sobre a população portuguesa, que Albert Silbert destacou pela sua originalidade. Já em 1755, num texto escrito em Paris, insistia no carácter científico que o estudo podia e devia assumir. Segundo Stockler, aplicou o cálculo de probabilidades às questões económicas e políticas relacionadas com a duração da vida humana.

Após o seu regresso a Portugal, não se lhe conhecem outros trabalhos astronómicos para além dos que tinha desenvolvido junto de Delisle.


Publicações

“Observations et explications de quelques Phénomenes vus dans le passage de Mercure audevant du disque du Soleil observé à l’Hotel de Clugny à Pariz le 6 de May 1753, et leur application pour la perfection de l’Astronomie. Publiées par M. de l’Isle de l’Académie Royale des Sciences &c.", Paris, 1753.
"Nouvelles équations pour la perfection de la Theorie des Satellites de Jupiter et pour la correction des Longitudes Terrestres déterminées par les Observations des memes Satellites", Mémoires de l’Académie Royale des Sciences et Belles-Lettres de Berlin pour l’année 1755.
"Nouvelles considérations sur les années Climatériques, la longueur de la vie de l’Homme, la propagation du Genre humain, et la vraie puissance des Etats considerée dans la plus grande population", Paris, 1757
"Lettre aus Auteurs des Memoires de Trévoux sur des nouvelles découvertes en Physique", Paris, 1757.
"Letre a Messieurs les Auteurs du Journal des Sçavans sur la navigation des Portugais aux Indes Orientales", Paris, 1758.
"Lettre a Messieurs les Auteurs du Journal des Sçavans avec l’extrait d’un Livre tres intéressant sur le Tramblement de terre de Lisbonne arrivé en 1755", Paris, 1759
“Memoria sobre os grandes benefícios do Sal commum em geral, e em particular do Sal de Setúbal comparado experimentalmente com o de Cadiz, e por analogia com o de Sardenha, e o de França”, Memórias Económicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa, t. I, 1789.
“Memoria sobre a causa da differente população de Portugal em diversos tempos da Monarquia”, Memórias Económicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa, t. I, 1789.
“Obsequios devidos á Memoria de hum respeitavel Monarca, e aos créditos de hum Vassallo o mais benemérito”, Memórias de Literatura, t. 5.
“Loxodromia da vida humana, ou Memoria em que se mostra qual seja a Carreira da nossa Espécie pelos espaços da nossa presente existência”, Memorias de Mathematica e Physica, t. II, 1799.

Fernando Reis e Luís Tirapicos



Bibliografia


AMZALAK, Moses Bensabat, O Economista José Joaquim Soares de Barros, Lisboa, 1930.
CARVALHO, Rómulo de, Portugal nas «Philosophical Transactions», nos séculos XVII e XVIII, Coimbra, 1956.
CARVALHO, Rómulo de, Relações científicas do astrónomo francês Joseph-Nicolas de l’Isle com Portugal, Coimbra, 1967.
FARIA, António de Portugal de, Ouvrages de José Joaquim Soares de Barros e Vasconcellos, Livourne, Raphael Giusti, 1899.
FERRÃO, António, Ribeiro Sanches e Soares de Barros : novos elementos para as biografias desses académicos : três cartas inéditas de Ribeiro Sanches (1758-1760) e vários documentos acerca do grande cientista José Joaquim Soares de Barros (1760-1761), Lisboa, 1936.
SILBERT, Albert, “Barros e Vasconcelos, José Joaquim Soares de”, SERRÃO, Joel (dir.), Dicionário de História de Portugal, Porto, Figueirinhas, 1981, vol. I
SILVA, Inocêncio da, Diccionario Bibliographico Portuguez, vol. IV, pp. 414-415.
STOCKLER, Francisco de Borja Garção, Elogio de José Joaquim de Barros e Vasconcellos, Leorne, Typ. Raphael Giusti, 1897.
TEIXEIRA, Francisco Gomes, História das Matemáticas em Portugal , Lisboa, Academia das Ciências, 1934.

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