Campos Rodrigues (1836-1919)



Campos Rodrigues fez carreira na Marinha Portuguesa mas foi sobretudo na astronomia de posição que os seus talentos impares se evidenciaram.

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César Augusto de Campos Rodrigues nasceu em Lisboa, a 9 de Agosto de 1836. Frequentou o Liceu e o Real Colégio Militar. Em 1851 assentou praça no Corpo de Guardas Marinhas. As promoções sucederam-se: era guarda-marinha em 1856, 1º tenente em 1869, capitão-tenente em 1878, capitão-de-fragata em 1886, capitão-de-mar-e-guerra em 1890. Por diversas vezes embarcado, em 1859 assiste ao bombardeamento de cantão pela esquadra inglesa, durante a guerra do ópio. Este episódio deu-se a bordo da lancha «Amazona», durante uma estada de 4 anos em Macau. Foi por esta altura que os seus interesses científicos se começaram a evidenciar. Campos Rodrigues e José de Castilho responderam então ao apelo de Mateus Maury para a recolha de registos meteorológicos, o que fizeram de Lisboa para Macau – numa viagem de 160 dias – e naquela cidade do oriente. Maury, após a recepção dos dados, comentaria que: «(…) o diário náutico do Brigue Mondego é uma peça curiosa, está admiravelmente desempenhado e dá-lhe grande crédito (…)».

Em 1865 Campos Rodrigues conclui o curso de engenheiro hidrógrafo e participou no levantamento da Barra e do porto de Caminha. Em 1869 era adjunto da secção astronómica da direcção dos trabalhos geodésicos. Filipe Folque, que já conhecia os seus méritos, desejava-o para ajudante. O decreto de 24 de Abril de 1869 veio facilitar o empenho de Folque. O nº 3 do artigo 13º referia que: «os engenheiros hidrógrafos servem nos observatórios astronómicos, meteorológicos e magnéticos». Em 1869 entrou para o Real Observatório Astronómico de Lisboa (ROAL), como ajudante da direcção geral. Em 1878 passa a subdirector por proposta da Academia das Ciências. Por sua vez, em Julho de 1890 foi nomeado director. Em 1902 era promovido a Vice-almirante.

Campos Rodrigues foi nomeado director, em 1890, do ROAL, na Tapada da Ajuda. Aí desenvolveria os seus principais trabalhos.

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O génio mecânico de Campos Rodrigues ficou bem patente nos numerosos aperfeiçoamentos que introduziu nos instrumentos do Observatório de Lisboa. Entre estes contam-se a cadeira de observação do círculo meridiano Repsold; um diafragma íris – que só mais tarde surgiria nas câmaras fotográficas – para regulação da iluminação nas oculares; um interruptor para pêndulas de sinais horários e um aparelho para a determinação da equação pessoal. Em 1874 criaria mesmo um revólver fotográfico. Este destinava-se a ser usado na expedição a Macau para observar o trânsito de Vénus de 9 de Dezembro. Campos Rodrigues foi nomeado observador, com F. A. Oom e Alves do Rio, mas a expedição não se realizou por falta de financiamento.

A 19 de Dezembro de 1904 um júri da Academia das Ciências de Paris decidiu atribuir-lhe o prémio Valz. Desse júri faziam parte personalidades como o matemático Poincaré e os astrónomos Bigourdan e Janssen. Instituído em 1874 pelos testamentários de Benjamin Valz, destinava-se a galardoar trabalhos no domínio da astronomia. Viria a ser atribuído a nomes célebres desta ciência como o alemão Wilhelm Tempel, o britânico Alfred Fowler ou o brasileiro Luís Cruls.

A distinção de Campos Rodrigues surgiu na sequência da participação do ROAL na campanha de observação do asteróide Eros, em 1900 e 1901. Essa campanha viria a marcar um salto qualitativo na determinação na distância Terra-Sol, uma constante fundamental da astronomia. Nela participaram 50 observatórios de todo o mundo. O observatório de Lisboa ficou encarregue, com outras doze instituições, da determinação rigorosa das coordenadas das estrelas – pontos de referência no registo da posição de Eros. As observações de Lisboa foram não só as mais numerosas (3800 seguidas apenas pelas 2700 efectuadas em Washington), mas também as que tiveram os menores erros associados.

Em 1908 seria instalado um Lourenço Marques, Moçambique, o Observatório Campos Rodrigues – assim nomeado em sua homenagem. A instalação dos equipamentos foi dirigida por M. F. Oom, mas só em de 1909, Hugo de Lacerda – um eng. Hidrógrafo que trabalhava naquela colónia como chefe dos serviços da Marinha – viria a dirigir o Observatório, realizando também as observações.

Em 1910 foi publicada a primeira edição do catálogo de estrelas do astrónomo norte-americano Lewis Boss. Nele o autor compilou numerosas observações dos mais importantes observatórios astrométricos da época. A participação de Campos Rodrigues e do Observatório de Lisboa foi então classificada pelo próprio Boss como «o melhor trabalho alguma vez feito». Campo Rodrigues morreu em Lisboa, no dia de Natal de 1919.


Luís Tirapicos



Publicações

Chronographo electrico, Lisboa, 1877.
Interruptor electrico, Lisboa, 1880.
«Observations d’occultations pendant l’éclipse total de la Lune, 1891, novembre 15», Astronomische Nachrichten, vol. 138, 1895, pp. 107-110.
Real Observatório Astronómico de Lisboa – Observations méridiennes de la Planète Mars pendant l’opposition de 1892. Lisbonne, 1895.
«Processos geométricos para resolver o problema dos três pontos, ou de Pothenot», in Curso de topografia por A. Mendes d’Almeida e Rodolpho Guimarães, vol. 1, 1899, pp. 471-474.
«Taboa de reducção ao horizonte», in Curso de topografia por A. Mendes d’Almeida e Rodolpho Guimarães, vol. 1, 1899, tabela 1.
«Observations des Léonides 1898, 1899», Astronomische Nachrichten, vol.158, 1899, n.º 3575, pp. 393-396 ; vol. 151, 1899, n.º 3608, pp. 119-122.
«The failure of the Leonids in 1899. Observations at Lisbon, Portugal», Popular astronomy, vol. 8, 1900, pp.24-25.
«Personal equation», The Observatory, Vol. 25, p. 121-124 (1902)
«Einfache einrichtung zur belenchtung der fäden eines kollimators», Zeitschrift für instrumentenkunde, vol. 22, 1902, pp. 142-143.
«Corrections aux ascensions droites de quelques étoiles du Berliner Jahrbuch», Astronomische Nachrichten, vol. 159, 1902, pp. 329-360.
«Um trissector», Il Pitagora, vol. 10, 1903-1904, p. 82.
«Observations des Léonides 1903 novembre 15», Astronomische Nachrichten, vol.164, 1904, p. 419.
«Observations d’éclipses de Lune», Astronomische Nachrichten, vol. 165, 1904, pp. 178-184.
Real Observatorio Astronomico de Lisboa – O novo planeta Eros e a distancia do Sol à Terra.
«Le problème de Pothenot», Revista di topografia e catasto, vol. 16, 1903-1904, pp. 100-102.
«Portuguese standard time», The Observatory, Vol. 34, p. 305-305 (1911)


Bibliografia

A.V., “Campos Rodrigues”, in Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira, vol. 5, pp.913-915.
D’Oliveira, João Brás, “Campos Rodrigues – Discurso pronunciado por ocasião da inauguração do seu retrato no Clube Militar Naval”, Tipografia de J. F. Pinheiro, Lisboa, 1906.
Guimarães, Rodolfo, Les mathématiques en Portugal, Imprensa da Universidade, Coimbra, 1909.
Mourão, Ronaldo Rogério F., Dicionário Enciclopédico de Astronomia e Astronáutica, Nova Fronteira, Rio de Janeiro, 1987.
Raposo, Pedro, “E o vencedor é… Campos Rodrigues”, in O Observatório, OAL, Vol. 10, Nº 7, p. 5, Setembro 2004.


Apontadores

Cronologia da vida e obra de Campos Rodrigues
http://www.oal.ul.pt/index.php?link=cronologiacr

Artigo na Revista da Armada
http://www.marinha.pt/extra/revista/ra_fev2005/pag_19.html

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