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Maria Archer, por Dina Botelho

Maria Archer


Maria Emília Archer Eyrolles Baltasar Moreira, na cena literária Maria Archer, nasceu em Lisboa, no dia 4 de janeiro de 1899. Foi a primeira dos seis filhos do casal. Parece ter escrito versos, com frequência, durante a sua infância, mas deles nada resta. Começou, desde cedo, a viajar com os pais. (De 1910 a 1913 Ilha de Moçambique; 1914 Algés e, posteriormente, Sto Amaro; de 1916 a 1918 Guiné - Bolama e Bissau.).

Terá feito apenas a 4ª classe (terminada aos 16 anos, por iniciativa própria), pelo que podemos considerá-la uma autodidata. Em 1921, encontramo-la em Faro com a família e aí casa com Alberto Passos, natural de Vila Real, no dia 29 de agosto de 1921. Vão viver para o Ibo – Moçambique. Cinco anos depois regressam a Faro e de seguida vão para Vila Real. Trás-os-Montes é o último cenário de fundo do jovem casal. O casamento durou apenas dez anos. Vem para Lisboa mas os seus pais estavam, nessa altura, em Angola e para lá vai por volta de 1932.

Em Luanda, publica o seu primeiro livro - Três Mulheres (1935) - de parceria com Pinto Quartim Graça. Nesse ano regressa a Portugal. Vivia, então, do que escrevia para jornais e das suas obras, tendo mesmo algumas delas chegado à terceira edição. A sua obra tem também um pouco de autobiografia pois a sua experiência de vida é, por vezes, transposta para as suas personagens. O romance Aristocratas (1945) marca o seu afastamento da família que se vê retratada nas personagens do mesmo.

A sua vida foi nessa época particularmente difícil. Teve de lutar pela sua afirmação pessoal e profissional. Participa, então, em várias conferências, em Lisboa e no Porto, e faz várias entrevistas como jornalista (a Ester Leão e a Joaquim Manuel de Mãos, o “Pintor” por exemplo). A 5 de julho de 1955 parte para o Brasil, depois de a sua obra ter sido perseguida em 1938 e 39, e terem-lhe apreendido o livro Ida e Volta duma Caixa de Cigarros e, em 1947, Casa Sem Pão.

Acompanhou, de perto, o julgamento do contestador da ditadura salazarista, capitão Henrique Carlos Galvão no Tribunal Militar de Santa Clara. Tendo-se proposto escrever um livro sobre o mesmo, vira a sua casa invadida pela Polícia Internacional e de Defesa do Estado (PIDE) logo após o final do julgamento, em 1953. Viria a publicá-lo em 1959, no Brasil, sob o título Os Últimos Dias do Fascismo Português.

Maria Archer 2


No Brasil, viveu pobre e doente, mas ainda escreveu bastante para alguns jornais, nomeadamente para O Estado de S. Paulo, Semana Portuguesa e Portugal Democrático. Naquele país, terá publicado cinco livros dos quais se conhecem apenas quatro: Terras onde se Fala Português, África sem Luz, Brasil, Fronteira da África e Os Últimos Dias do Fascismo Português (1959). Em 1974 ainda corrigiu os discursos dos candidatos às eleições legislativas e escreveu a propaganda para a rádio local. Em 1977 foi internada em São Paulo, donde terá saído para regressar a Portugal (26 de abril de 1979).

Foi, então, internada na Mansão de Santa Maria de Marvila (Lisboa), lar onde permaneceu até à morte (23 de janeiro de 1982).

A obra de Maria Archer foi bastante diversificada. Tendo iniciado a sua obra literária nas colaborações em periódicos (Acção, Correio do Sul, Diário de Lisboa, Eva, Fradique, Humanidade, Ilustração, Ler, O Atlântico, O Mundo Português, Portugal Democrático, Seara Nova, Sol, Última Hora, O Estado de S. Paulo e Gazeta de São Paulo), o primeiro livro publicado foi uma novela.

Atrever-nos-íamos a distinguir três fases na escrita da autora, sem pretendermos estabelecer compartimentos estanques. Assim de 1935 a 1944 (publica o seu primeiro romance Ela É Apenas Mulher) temos a fase em que foi sobretudo novelista ou contista. De 1944 a 1955 (data em que parte para o Brasil), atinge o auge da sua produção literária, revelando-se uma ótima romancista, observadora e narradora dos problemas que atingem a mulher dessa época. A terceira fase é iniciada em 1956, com a publicação de vários artigos no Portugal Democrático e publicação do livro que resultou da assistência às sessões do julgamento de Henrique Galvão. Com ele inicia a sua afirmação política, que coincide com a colaboração nos jornais Portugal Democrático e na Semana Portuguesa, ambos de São Paulo. Esta divisão não pretende ser rígida até porque, ao longo das três fases, temos uma linha condutora que é a dos ensaios e estudos sobre África e os costumes do seu povo (13 livros). Escreveu trinta livros em 28 anos, três deles chegaram à terceira edição e cinco tiveram três, o que mostra bem a recetividade do público à sua obra. Muito contestada por uns e muito apreciada por outros, todos lhe reconhecem um valor inigualável na literatura feminina do início do séc. XX. Na narrativa saltita da novela para o romance e deste para o ensaio ou literatura de viagens, chegando mesmo a focar os descobrimentos portugueses. Escreveu, também, 5 peças de teatro e ainda um romance de aventuras infantis e dois ensaios para que o público mais pequeno aprendesse um pouco de história de forma lúdica. No entanto, foi na forma audaciosa como retratou a mulher portuguesa e os seus problemas familiares e sociais que se tornou um marco na literatura feminina de meados do séc. XX. Dizia João Gaspar Simões, em 1930 «Não conheço mesmo outra (escritora portuguesa) que à audácia dos temas e das ideias alie uma expressão tão enérgica e pessoal. O seu estilo respira força e solidez.»


Bibliografia Sumária (ordem cronológica)

Três Mulheres , parceria com Pinto Quartim Graça, Luanda, 1935.

África Selvagem , Lisboa, Guimarães & lda, 1935.

Sertanejos, nº9, Lisboa, Editorial Cosmos, 1936.

Singularidades de Um País Distante, nº11, Lisboa, Editorial Cosmos, 1936.

Ninho de Bárbaros, nº15, Lisboa,Editorial Cosmos, 1936.

Angola Filme, nº19, Lisboa, Editorial Cosmos,1937

Ida e Volta duma Caixa de Cigarros, Lisboa, Editorial O Século, 1938.

Viagem à Roda de África, romance de aventuras infantis, Lisboa, Editorial O Século, 1938.

Colónias Piscatórias em Angola, nº32, Lisboa, Cosmos, 1938.

Caleidoscópio Africano, nº49, Lisboa, Edições Cosmos, 1938.

Há dois Ladrões sem Cadastro, Lisboa, Editora Argo, 1940.

Roteiro do Mundo Português, Lisboa, Edições Cosmos, Lisboa, 1940.

Fauno Sovina, Lisboa, Livraria Portugália, 1941.

Memórias da Linha de Cascais, col.com Branca de Gonta Colaço, Lisboa, Parceria António Maria Pereira, 1943.

Os Parques Infantis, Lisboa, Associação Nacional dos Parques Infantis, 1943.

Ela É Apenas Mulher, Lisboa, Parceria António Maria Pereira, 1944

Aristocratas, Lisboa, Editorial Aviz, 1945.

Eu e Elas, Apontamentos de Romancista, Lisboa, Editorial Aviz, 1945.

A Morte Veio de Madrugada , Coimbra, Coimbra Editora Lda, 1946.

Casa Sem Pão , Lisboa, Empresa Contemporânea de Edições, 1947.

Há-de Haver uma Lei , Lisboa, Edição da Autora, 1949.

O Mal Não Está em Nós, Porto, Livraria Simões Lopes, 1950.

Filosofia duma Mulher Moderna , Porto, Livraria Simões Lopes, 1950.

Bato às Portas da Vida , Lisboa, Edições SIT, 1951.

Nada lhe Será Perdoado , Lisboa, Edições SIT, 1953.

A Primeira Vítima do Diabo , Lisboa, Edições SIT, 1954.

Terras onde se fala Português , Rio de Janeiro, Ed. Casa do Estudante do Brasil, 1957.

Os Últimos Dias do Fascismo Português , S. Paulo, Editora Liberdade e Cultura, 1959.

África Sem Luz , São Paulo, Clube do Livro, 1962.

Brasil, Fronteira da África , São Paulo, Felman-Rêgo, 1963.

Herança Lusíada , Lisboa, Edições Sousa e Costa, s.d..


Peças de Teatro

Alfacinha, comédia em 1 acto para uma só personagem, publicada no Sol. de 12 a 26. Fev. 1949.

Isto que chamam amor , drama em um acto para uma só personagem.

Numa casa abandonada , drama em um acto para uma só personagem.

O poder do dinheiro , comédia em 3 actos.

O Leilão , drama em 3 actos.