Época Medieval

Renascimento em Portugal

Sob o Signo das Luzes

A Filosofia Portuguesa do Séc. XIX
até à Proclamação da República
A Filosofia Portuguesa depois de 1910

Diogo Lopes Rebelo

Diogo Lopes Rebelo, também conhecido por Jacob Lupi, é um autor dos finais do século XV, havendo até ao momento dados muito escassos sobre a sua vida. Sabe-se que era português, mas ignora-se onde tenha nascido, havendo todavia informações seguras de que foi mestre de Gramática do Duque de Beja, futuro D. Manuel I, por ordem de quem foi estudar para Paris, provavelmente em 1497. Foi a partir desse ano que iniciou a publicação das suas obras, a maioria das quais de conteúdo essencialmente teológico, nomeadamente Fructus sacramenti poenitentioe, o Tractatus de productionibus personarum, e o Liber de assertionibus catholicis e apostoli Pauli. Entre as obras cujo conteúdo nos interessa destacar do ponto de vista filosófico conta-se o De republica gobernanda per regem, editado na última década do século XV, dedicado a D. Manuel I, e de conteúdo essencialmente ético-político.

Os temas abordados coincidem com os que encontramos em autores como D. Pedro ou Álvaro Pais: a origem do poder, o seu fundamento e finalidade, o personalismo régio, o pacto de sujeição, o direito de resistência, as formas de governo.

Para Diogo Lopes Rebelo o poder político é uma emanação necessária da razão, tendo por isso o seu principal fundamento no direito natural, comum a todas as nações e independente de constituição alguma. A sua necessidade radica no princípio da conservação da vida, comum a todos os homens, que por isso se reúnem em sociedade. Para tanto, invoca o preceito segundo o qual o homem é um animal social por natureza, agregando-se num todo harmónico que dá guarida à divisão de tarefas, à semelhança do corpo humano, em que cada órgão exerce a sua função com vista à conservação do todo.

Em conclusão, o poder político é uma realidade constitutiva da natureza humana e, atendendo ao primado da unidade sobre a multiplicidade, sustenta, com argumentação de ordem metafísica, a excelência da monarquia -- por ser o governo de um só -- entre as demais formas de governo enunciadas por Aristóteles.

A questão da origem do poder fica assim esclarecida, pois sendo Deus o autor da razão humana e da sua natureza sociável, daí se conclui, como dissera S. Paulo, que não há poder que não venha de Deus, embora a sua origem mais imediata radique no conjunto dos homens reunidos em sociedade, ou seja, no povo, que o transfere ao soberano.

Uma vez feita esta transferência, ou alienação do poder na figura de um chefe temporal, este último fica superior à comunidade e dela deixa de depender, não conhecendo, no plano temporal, qualquer dignidade superior. Possui assim a autoridade mais digna e excelente, dignidade que lhe advém, por paradoxal que pareça, do espírito de serviço inerente ao conceito de ofício, qual o de zelar pelo bem comum, preservando a justiça e o direito, no quadro de uma atmosfera tutorial e paternalista.

Entre as contribuições mais interessantes de Lopes Rebelo para o pensamento político português, conta-se a defesa que faz do direito de resistência activa aos tiranos que tenham alcançado o poder de forma ilegítima, embora o não defenda no caso dos tiranos que tenham acedido legitimamente a dignidade régia.

Neste último caso, entende que mesmo agindo de forma perversa, o tirano preserva a virtude, não própria mas alheia, no sentido em que continua a representar Deus e a comunidade a que preside.

Finalmente, como tópico de não menor relevância encontramos a questão das relações entre o poder temporal e o poder espiritual. Estamos perante jurisdições distintas, cada uma com a sua esfera de acção. No entanto, sendo autónomos, não se encontram desarticulados, pois em todas as esferas da existência importa que as coisas materiais se ordenem às espirituais, e sendo o espírito mais digno que a matéria, afigura-se-lhe legítimo comparar o poder espiritual ao «astro maior» e o poder temporal ao «astro menor».

Obras
Fructus sacramenti poenitentioe , Paris, 1494; Tractatus de productionibus personarum, Paris, 1496; De republica gobernanda per regem, Paris, 1496 (edição bilingue em Latim e Português, com tradução de Miguel Pinto de Meneses, e introdução de Artur Moreira de Sá, Lisboa, 1951)

Bibliografia
Artur Moreira de Sá, Vida e Obra de Diogo Lopes Rebelo, introdução à edição bilingue do De republica gobernanda per regem, Lisboa, 1951; Pedro Calafate, «Diogo Lopes Rebelo», Logos-Enciclopédia Luso-Brasileira de Filosofia, Lisboa-São Paulo, 1988-92; Manuel Paulo Merêa, Estudos de História do Direito, Coimbra, 1923; Angeles Galino Carrillo, Los tratados sobre educación de principes (siglos XVI e XVII), Madrid, 1948; Martim de Albuquerque, O Poder Político no Renascimento Português, Lisboa, s.d.

Pedro Calafate


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