Localização das Amostras - Gravações do Grupo de Variação do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa  -  Registos Sonoros


Dialectos portugueses setentrionais:

região subdialectal do Baixo-Minho e Douro Litoral
Vila Praia de Âncora 
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INF = Informante

INQ = Inquiridor

 

INF Mas naquele tempo que nós fomos, o gelo dava por aqui. O 'snow', o 'snow'.

INQ1 Pois, pois.

INF Como caiu aqui há dias. Vocês, não caiu lá em Lisboa?

INQ1 Não.

INQ2 Não, não chegou…

INQ1 Porquê, aqui caiu, foi?

INF Ei Jesus! Aqui, esta altura, de 'snow'! Tudo em farrapinhas, farrapos! Lá em Lisboa não caiu?

INQ1 Não, lá em Lisboa não…

INF Quem é que disse?

INQ1 Em Lisboa, mesmo?

INQ2 Caiu perto. Caiu perto de Lisboa mas não caiu…

INQ1 Não, mas em Lisboa não caiu…

INQ2 Não, não, na cidade não.

INF Parece… Ai, eu parece que vi na televisão lá a cair. Amostrou…

INQ1 Não, em Palmela. Em Palmela é que caiu.

INF Aqui, ai Jesus! Até fizeram estátuas, aí estátuas… Pessoas, pessoas de gelo, com gelo, pessoas aqui, hem.

INQ 1 Ai, que giro!

INF Aquilo foi uma… Aquilo foi uma festa!

INQ1 Mas já há muito tempo?… Há muitos anos que não havia aquilo?

INF Não. Já caiu há coisa de quê? (…) Deixe ver. Talvez há mais de trinta anos. Caiu, mas foi só um bocadinho de nada – umas farrapinhas, umas farrapinhas. Mas agora, ai Jesus!

INQ1 Mas era assim de um metro quase de altura, não?

INF Talvez! Daqui assim, oh! Caiu muito! Muita coisa. Tudo branquinho!

INQ1 E ficou muito frio?

INF Não. Frio não era, porque aquilo era só farrapas e não estava vento, sabe? Não caía vento. Aquilo foi um colosso! Ai, Jesus! Meu Deus!

INQ1 Ai, deve ter sido giro!

INF Saiu tudo, os rapazes e as raparigas, para a rua. Eu tenho uma filha, que está ali em baixo, no largo, numa papelaria. Essa deixou o serviço para ir (…) para a rua, para a estrada, com os rapazes, ajuntar aquele gelo. Tudo! Fizeram lá uma estátua grande, um homem. Aqui na praia (…)… Sabe onde é que é a praia, dos barcos?

INQ1 Sim.

INF Fizeram (…) uma estátua (…) daquilo. (…) Pegaram num carrinho daqueles de mão, levaram para o largo da capela.

INQ1 Que engraçado!

INF Aquilo foi um (rol aí) de fotografias, ai Jesus! Eu ouvi dizer que… Então em Lisboa não caiu daquilo?

INQ1 Não, em Lisboa não caiu…

INF Não, olhe (…). Aquilo era um… Ai que… Ai que bonito!

INQ1 Deve ter sido muito bonito.

INF Isto, daqui para o norte, espalha tudo.

INQ1 Ficou tudo branquinho?

INF Tudo, até… Portugal e tudo, aqui até lá ao… Bem, em Lisboa não sei…

INQ1 Em Lisboa não caiu mesmo.

INF Não?… Ai, ai, que bonito era! Ai!

INQ1 Devia ser muito bonito!

INF Bem, aquilo, para nós, bonito (…) não há nada, mas… Mas naquela ocasião foi bonito. Caiu… Sabe porque é que caiu (e) até foi bonito? Porque não havia sementeiras, não havia batatas. Senão aquilo queimava tudo.

INQ1 Aquilo queimava tudo.

INF Ui Jesus! Ele ainda queimou (…) muitas (côas).

INQ1 As árvores, não?

INF Não, as árvores não. (…) Frutos, frutos. Mas agora está tudo… Agora não… (Ele não)… Por aqui não era muito frio. Mas havia farrapas que era isto! Pedaços de farrapas, daquelas (que vinham do)… Ai que alegria!

 

© Instituto Camões, 2002