Localização das Amostras - Gravações do Grupo de Variação do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa  -  Registos Sonoros


Dialectos portugueses centro-meridionais:

região subdialectal do Barlavento do Algarve

Sagres  1

INF = Informante

INQ = Inquiridor

 

INF1 Estas bagas que tem, portanto, não se põem estas bagas no anzol, está a perceber? Portanto enfia-se (…) as

bagas na seda e põe-se (…) o anzol por baixo, ou seja o anzol duplo, de dois anzóis; portanto, o peixe vai-se pôr (…)

a comer (…) a erva, não é?

INF2 Pois.

INF1 Depois, no que se vê estar a comer, dá-se-lhe a aferrada e o anzol espeta por baixo e fica

assim preso.

INQ É quase como apanhar um peixe (com um pau).

INF1 É isso, é.

INF2 É, é.

INQ Portanto ela não (pega no anzol)?

INF2 É. É por isso… É por isso que chamam-lhe, eu não sei, chamam-lhe (…) a erva de salema.

INF1 Ela não pega no anzol. Portanto, fica pendurado ali, (…) depois vai comer donde se dá o puxão, fica presa (no anzol).

INF2 Tem… Tem logo dois anzóis. (Elas, ás vezes)… Agora é que apanham muito pouco, mas antigamente iam muitos homens assim já velhotes, iam muito pescar à salema, com estas baguinhas.

INF1 Pois.

INF2 Isto era uma… E há aqui na rocha. Cá em Sagres há… Há isto também, erva de salema.

INF1 Pois isto é assim. Isto (…) o mar (…) tem segredos, às vezes.

INQ1 É verdade.

INF2 E tem muita coisa.

INF1 (Oh, esse que está a ir ali para fora é que está a falar com os senhores).

INF 2 Tem… Que até há… Tem também… Tenho visto às vezes passar aquelas… Uma… É aquela água-morta (que) parece uma couve-flor.

INQ O que é isso?

INF2 É uma coisa muito grande.

INQ Parece um chapéu?

INF1 (Até logo, Francisco).

INF2 Um chapéu. E às vezes…

INQ Tem uns raios para trás?

INF2 Tem uns raios para trás… Há… E aí há…

INQ Não chamam alforreca, aqui?

INF1 Chamam, chamam.

INF2 Chamam-lhe alforreca também.

INF1 Aquilo são. É… É…

INQ Aqui também se chama alforreca. É a mesma coisa que o senhor está a dizer?

INF1 É água-má. Ao fim e ao cabo aquilo é um vivente.

INF2 É água-mau. É um vivente.

INF1 É linda.

INF2 Então, tem… E tem olhos e tudo, que a gente vê os olhinhos.

INF1 Nós chamamos uma alforreca (e ainda há uma) água-má que anda só a…

INF1 E os olhinhos (…) é que é uma coisa escurinha, parece quase uma azeitona…

INF1 Aquilo ali é um vivente. Apesar de ser um (…), é um vivente.

INF2 (…) Agora o resto é tudo é… É tudo uma água morta. Mas há aí alguns são muito bonitos, muito grandes; às vezes há de quilos.

INF1 Agora livrar (…), portanto, daquela água ir para os olhos: (se for para lá), pode cegar.

INF2 E há outros que, também, que andam por cima da água, parece umas caravelazinhas, também pequeninas… INQ Sim senhor. (Também já vi).

INF2 Que andam só…

INQ Como é que chamam a isso? Caravelas?

INF2 Pois, como é… (A gente também é) caravelas. Às vezes é…

INF1 Portanto, quando aparece essas caravelas por cima da água é sinal de mau tempo.

INF2 Pois.

INQ Pois, pois. Que aparece assim grande, não é?

INF2 É vento cá do mar. Que quando tem tempos bons…

INQ1 Nas marés vivas não aparece as caravelas?

INF1 Não. É… É… Aparece é quando está tempo…

INF2 Não. Aparece mais é no mês de Outubro, Novembro. Setembro, Outubro, Novembro.

INF1 (…) Quando vem um vento cá de sudoeste.

INF2 Às vezes (por causa do) sudoeste, quando (…) (traz) aquelas caravelas, é sinal de mau tempo.

INF1 Às vezes está dois ou três dias que há vento cá deste lado e vem. (…) Isso anda muito fora. Agora essas alforrecas também às vezes dá à costa, muito grandes e parece uma couve-flor, com aquela flor. E (…) há várias qualidades de alforreca também… Não há… Não há…

INQ Olhe, e não há outras algas sem ser estas duas que eu tenho aqui?

INF2 Há mais.

INQ  Há mais?

INF1 Há limos. Há aquele que apanha-se…

INQ Limos qual é? Aqueles verdes?

INF2 Aqueles verdes. Pois.

INF1 Há verdes. Há limos verdes.

INF 1 Sargaço.

INF2 Há o tal limo que é, portanto, que é especial, que é próprio (…) para fazer plásticos e não sei quê. Que se usa em medicamentos também, e não sei quê.

INF2 Pois até, até…

INQ  Sim, sim. O sargaço o que é?

INF1 Há o sargaço também.

INF2 É uma espéce de limo, também.

INF 1 Mas é um limo muito áspero e tudo.

INF1 É castanho. É castanho assim verdoso.

INQ Muito áspero, assim todo aos raminhos (dobradinhos)?

INF2 Pois.

INF1 Pois, exactamente. Há várias coisas.

INQ  Sargaço.

INF1 Há o sargaço, há… Há várias…

INQ E esse sargaço serve-lhe para alguma coisa, ou não?

INF1 Serve.

INF2 (…) O sargaço (…) é quase sempre (…) é: as pessoas noutro tempo iam buscar para pôr nos terrenos.

INF1 Adubo. O sargaço serve de, portanto, de adubo para os terrenos.

INF2 (A descer) de esterco. Que as pessoas iam… O que é que dá muito trabalho, não é? Noutro tempo, tinham os burros e levavam o burro (à praia), mas (…) agora já não.

INQ Mas faziam isso aqui em Sagres?

INF2 Em Sagres.

INF1 Faziam.

INF 2 Levavam aquelas cargas…

INF1 É para pôr na vinha que é uma coisa que dá muito (reforço) à vinha.

INF2 E… E… Para pôr na vinha. E depois punham esterco por cima, (…) coiso. Aquilo aquecia, aquilo com (a onda de) calor, apodrecia tudo…

INF1 Aquilo apodrece e serve de estrume para a…

 

© Instituto Camões, 2002