Localização das Amostras - Gravações do Grupo de Variação do Centro de Linguística da Universidade de Lisboa  -  Registos Sonoros


Dialectos portugueses insulares: madeirenses

Caniçal  1

INF = Informante

INQ = Inquiridor

 

INQ1 Pois. Quando aparecia uma baleia lá ao longe, o que é que havia aqui em terra e quem é que via a baleia e isso?

INF Tinhamos… Tinha-se um vigia lá no monte – lá em cima naquele cabeço –, um vigia que olhava (…) para a sua área – (aquilo) na de sul e norte. E tinha outros vigias. Tinha na Ponta do Pargo, tinha em São Jorge, tinha (…) no Garajau, tinha nas Desertas, Porto Santo. Tudo… Estava tudo minado (…) com vigias.

INQ1 (…) E só aqui é que havia embarcações ou havia noutros pontos da ilha?

INF É. É só aqui, só.

INQ2 E depois faziam os sinais? Os vigias como é que faziam?…

INF (…) Os sinais era por meio (…) do rádio. Tinha-se rádios a bordo das embarcações. Os primeiros anos que começámos a trabalhar era com um lençol – um lençol branco. Depois, quando eu estava muito longe, eles então faziam fumo, faziam fumo de sinal. Quando eu (…) via (…) que as baleeiras iam direito (…) às baleias, eles apagavam. Apagavam… Apagavam o fumo.

INQ2 Portanto (…)

INQ1 E com o lençol, também eles não indicavam a direcção?

INF E com o lençol também era a mesma coisa. O lençol, eles botavam o lençol no ar. A gente via o lençol. Eles viam que a gente ia… (…) Andava-se com a baleeira de roda. A baleeira deixava a um ponto que a baleeira ia no rumo certo, eles tiravam o lençol de repente.

INQ3 Ah!

INF Tiravam o lençol que é para a gente levar o rumo certo, à baleia.

INQ2 (Que giro).

INF Pois.

INQ1 E depois? Portanto, o senhor ia na direcção boa…

INF Depois ia-se na direcção e chegava-se ao…. Estava ocasiões que dava-se com elas; e estava ocasiões que (a gente) não se dava. E quando se dava com elas, começava-se a balear. Tinha-se as embarcações para cercá-las, (…) mais (…) próximo (…) à costa, para…. Mas quanto mais (…) próxima da costa, melhor, para a gente matar a baleia. Porque elas mergulhavam e já, de repente, já saíam. E (…) mais fora, elas mergulhavam e demoravam muito tempo no mar, no fundo, para saírem. A gente… Estava ocasiões que elas saíam já longe. Saíam um pedaço longe. Furavam… Furavam as embarcações por baixo, e já saíam já lá fora. A gente tinha-se que ir, outra vez, a remar, remar, remar, para fora, para elas. E depois aquilo a gente ali todo o dia ali a remar, ali a se transpirar, puxava-se, matava-se as baleias, vinha-se (…) para a fábrica. Tinha-se um barco (…) de apoio para rebocar as baleias, para trazer elas para a fábrica. Chegava-se à fábrica – às vezes tinha-se trabalho lá na fábrica –, tornava-se a trabalhar, a noite inteira a trabalhar. Depois foi quando a gente fizemos uma reclamação aos patrões porque a gente trabalhar com umas canoas de remos que matava muito pessoal. Então foi quando eles resolveram fazer canoas a motor. Então, eu… Tinha-se lá o molde, e eu é que construí essas embarcações todas. Era (…) sete embarcações a remos. Passou a ficar três (…) a remos e quatro a motor. Pois.

INQ2 Mas iam com todas elas?

INF Sim. (…) Com todas elas. Depois foi quando a gente ia-se para Porto Moniz – (…) eu estive cinco anos no Porto Moniz (…) com duas baleeiras. Essas baleeiras, (depois era): aquilo ali, em ocasiões, chegava-se lá, queria-se varar, e não se podia, porque o mar ali era ruim. Era (…) num varadouro. Aquilo o mar arrebentava ali, a gente tinha que se vir outra vez para o sul. Depois foi quando eles resolveram meter canoas no Porto Santo – duas canoas no Porto Santo. Então varava-se lá na praia, ali mesmo perto do cais. E quando havia baleias para aqui (…) para a Madeira, vinha-se para a Madeira. Quando havia para o Porto Moniz, vinha-se para o Porto Moniz – já (…) com o rumo já por trás de Porto Santo, direito a Porto Moniz. Pois.

INQ1 Mas quando apanhavam as baleias no Porto Moniz, depois tinham que rebocá-las para aqui ou?...

INF Tinha-se o barco para trazer as baleias para Porto Moniz – (…) para a fábrica.

INQ1 A fábrica era só aqui?

INF Pois. Quando era… Quando era muita quantidade de baleias, a gente tinha que vir, (…) para ajudar a cortar. Quando era só um cachalote só, a gente ficava lá. Ficava-se lá (…) no Porto Santo ou no…. Quando se estava a trabalhar no Porto Moniz, ficava-se no Porto Moniz. Quando começámos a trabalhar no Porto Santo, havia uma baleia só, a gente ia para o Porto Santo. Porque ao outro dia podia haver – podia aparecer – baleias para lá, para o Porto Santo, estava-se lá mais perto. Pois. Pois.

INQ1 E essa baleia depois como é?… Ficava a flutuar? Punha-se uma coisa para ela ficar depois no mar?…

INF Ficava acima do mar, com uma bandeira.

INQ2 Mas como é que a matavam?

INF Era com o arpão. Era trancada com o arpão. E depois era morta com a lança. Matava-se. Quando tinha-se uma média de quinhentos metros de corda, e tinha-se as baleeiras ali, quando a gente trancava, a gente deitava bandeira, para uma baleeira vir para o pé da gente. Porque estava ocasiões que a baleia (…) levava aquelas cordas todas. E então, vinha a baleeira. A gente passava a corda; (ele) passava a corda (…) da outra baleeira para a nossa; era encadeada (…) na nossa corda. Quando (…) levava as nossas linhas, já ficava presa por a outra, por a outra embarcação.

 

© Instituto Camões, 2002