Objecto Cardíaco - Casa para as artes, Lda.
2006, 64 pp.
ISBN: 972-8983-06-9
www.objectocardiaco.pt
Livro de Maldições, de Valter Hugo Mãe, assinala a criação da nova editora do autor denominada Objecto Cardíaco. A obra é composta por um conjunto de poemas de títulos insólitos, que fogem à normalidade, cada um deles dedicado a familiares e amigos.
O poema da cumplicidade sobre um homem que não ficava muito tempo em parte alguma, a maldição contra a triste normalidade, a princesa feia que não casou, o homem sem quotidiano que nunca foi visto duas vezes, as crianças que não tinham um braço no meio do peito, e por isso eram incapazes de agarrar nos corações umas das outras, o rapaz muito alto que tinha medo de ser grande demais para caber num coração e as árvores que pensam e que ficam generosas à espera de chegar a uma conclusão fazem parte desta obra que parte do real para descrever o sonho e a fantasia.
«os dragões chineses, nos sonhos dela, eram mais perigosos do que um avião caindo. assim, quando o avião caiu, entrou em combustão e ela só se lembrava dos dragões. saltou porta fora sem mais nada, e enquanto caía, antes de se desmanchar no chão, olhou para trás vezes sem conta, apavorada a ver se algum bicho em brados de fogo a perseguia». (poema da obsessão)
«as coisas ensinam o chão. explicam-lhe quanto há entre terra e céu, o caminho livre do voo, a vista elevada de deus. eu vejo anjos e os anjos são das coisas aladas os sonhos mais completos. erguem-se braçados de asas a educar o vento, percursos de sopro que se abrem nas dimensões, e luzem nas nossas cabeças como homens enfim pássaros. como se as árvores pudessem ser casas nossas e nada nos acordasse na força do frio ou ou da chuva. como se nos cumprimentássemos em pleno ar, seres tão leves atarefados com mais nada. seríamos só pulmões cheios, máquinas de pairar, alegres imprecisões ao alto.» (poema das coisas aladas)
Valter Hugo Mãe é poeta e editor. Nasceu em 1971 em Angola e vive em Vila do Conde. Publicou nove livros de poesia, entre os quais: egon schielle auto-retrato de dupla encarnação (Prémio de Poesia Almeida Garrett); três minutos antes de a maré encher; a cobrição das filhas; útero e o resto da minha alegria. É autor das seguintes antologias: O encantador de palavras, poesia de Manoel de Barros; Série poeta, Homenagem a Julio-Saúl Dias; Quem quer casar com a poetisa, poesia de Adília Lopes; O futuro em anos-luz, 100 anos, 100 poetas, 100 poemas, para o Porto 2001 e Desfocados pelo vento, A poesia dos anos 80, Agora. Poemas seus estão traduzidos e editados em espanhol, francês, inglês, checo e árabe.