Linschoten, Jan Huygen van
Jan Huygen van Linschoten foi o holandês que ficou mais ligado à História de Portugal. A sua marca e presença é de tal forma polémica que quase foi apagada de muitos manuais enquanto nos Países Baixos é tido como um herói. Importa aqui saber quem foi e como ganhou direito a um lugar de destaque na memória portuguesa.
Linschoten nasceu no final de 1562 ou inícios de 1563. Embora quase todos os autores apontem para Eukhuizen, dados mais recentes revelaram que o local de nascimento foi Harlemo e que a se família mudou para a primeira cidade pouco depois devido à perseguição de que foram vítimas por serem católicos. O pai era um funcionário público com algumas posses, sendo Jan Huygen o primeiro de três filhos.
Aos 16 anos decide abandonar a casa dos pais e começa a cruzar-se com um destino que o trará até Portugal. Em 1579 segue para Sevilha, onde vivem dois meio-irmãos, e através deles consegue arranjar um emprego em 1580 na companhia de um comerciante holandês em Lisboa. A experiência no comércio internacional dura pouco e em 1583 inicia-se nova fase que o levará até ao Oriente.
Novamente através de um meio-irmão consegue entrar ao serviço do recém nomeado Arcebispo de Goa, D.Vicente da Fonseca, seguindo no seu séquito. Na função de guarda livros ganha rapidamente a admiração do Arcebispo pelo seu trabalho. Em 1586 o Arcebispo regressa a Lisboa deixando Linschoten algo abandonado. Quando sabe, em 1588, da sua morte, a que se junta a do seu pai e do irmão, decide regressar a casa. Em Agosto de 1589 desembarca na Terceira onde fica até 1591, chegando à Holanda a 3 de Setembro de 1592, depois de uma breve passagem por Lisboa onde despacha os últimos negócios pendentes.
Linschoten chega aos Países Baixos quando a luta pela independência está mais acesa, ao mesmo tempo que vê a sua cidade adoptiva viver uma actividade comercial bastante apreciável. Com as informações recolhidas ele era uma mais valia muito importante e depressa trava conhecimento com alguns dos homens envolvidos na expansão holandesa. Apercebendo-se da relevância das suas informações começa a preparar a sua publicação, até porque o editor e tipógrafo Cornelis Claesz se contava entre as suas amizades. Se os seus conhecimentos eram mais precisos para o Oriente e sobre as rotas portuguesas, desde cedo mostrou grande entusiasmo pela exploração da chamada Passagem do Norte. Chegou mesmo a participar numa das viagens de exploração que naturalmente se revelou um fiasco.
É na exploração das rotas portuguesas de ligação ao Oriente que as informações de Linschoten são mais importantes e curiosamente a primeira expedição, com a qual colaborou, larga âncora no dia do seu próprio casamento, em 1595. Em 1596 é finalmente publicado o Itinerário, obra em que Linschoten compila todo o tipo de informações sobre o Oriente.
O Itinerário é visto como a obra inspiradora da exploração holandesa embora só tenha sido publicado após a primeira viagem organizada nos Países Baixos. Mesmo assim Linschoten colaborou na sua preparação e deve logo aí ter passado muita informação. O objectivo era fornecer o maior número de dados para que todos estivessem cientes da importância e potencialidades do Oriente. Quando não tinha informações directas Linschoten recorreu a relatórios ou outros autores (caso de Camões ou de Garcia de Orta) para completar os dados, o que fez do Itinerário uma obra fundamental até para se perceber o alcance do conhecimento do Oriente nos finais do século XVI. Com todos estes condimentos a que se juntam as gravuras belíssimas e uma escrita agradável, a sua obra tornou-se num enorme sucesso, multiplicando-se as edições, as traduções e até as compilações que pretendiam levar a mais pessoas um livro que na sua forma original era bastante caro e grande. O sucesso estava contido na própria divisão do livro com a descrição das viagens, roteiros diversos e a explicação da costa africana.
Um apontamento final deve ser feito relativo a uma polémica antiga e que apontava Linschoten como um espião. Para comprová-lo estava a forma como obtera a informação, a diligência a compilá-la e a prontidão a publicá-la. No entanto é preciso não esquecer que só por ser um católico de confiança é que viaja com o Arcebispo e só tem acesso a muita informação porque os portugueses o colocam no cargo de guarda livros. Para além disso é só após o regresso à Holanda que a situação de conflito se agrava e o próprio Linschoten toma maior consciência política da importância da informação que trouxera. Daí que as mais recentes investigações apontem para o facto de ele ser apenas um católico que obteve valiosos dados, os compilou quase como se faz com as memórias e que depois foram utilizados política e militarmente.
Morreu a 8 de Fevereiro de 1611 com 48 anos de idade deixando diversas outras obras e que lhe trouxeram a glória junto dos holandeses pela importância que tiveram para as suas explorações rumo ao Oriente. O Itinerário ficou como o primeiro e mais importante marco dessa divulgação sendo, apesar da complexidade que rodeia a sua edição, uma obra fundamental na História dos Países Baixos, mas também na de Portugal.
Bibliografia
LINSCHOTEN, Jan Huygen van, Itinerário, Viagem ou Navegação para as Índias Orientais ou Portuguesas, Ed. Arie Pos e Rui Manuel Loureiro, Lisboa, C.N.C.D.P., 1997.
|