Biografias

Dulmo, Fernão

Sendo um dos flamengos que se estabeleceram nos Açores, e tendo-se instalado na costa norte da Terceira, Fernão Dulmo, ou Ferdinand van Olm, foi nomeado capitão dessa parte da ilha, ficando a capitania da parte sul entregue a João Vaz Corte-Real.

O seu nome aparece associado às iniciativas de exploração do Atlântico Ocidental levadas a cabo durante o reinado de D. João II. Com efeito, Dulmo, apresentando-se ao monarca, declarou a sua intenção de explorar o Atlântico em busca de ilhas ou terra firme, devendo as despesas de tal empresa serem por si suportadas. A 3 de Março de 1486, D. João II emitiu as respectivas cartas de privilégio, outorgando-lhe quaisquer ilhas ou continentes que por si ou por qualquer outro sob as suas ordens «as ter descoberto ou achado», bem como a jurisdição civil e criminal sobre as mesmas, afirmando a hereditariedade desta concessão e dos proventos daí resultantes. Na  verdade, o interesse do monarca no projecto de Dulmo é bem patente na carta que lhe dirigiu, afirmando que, caso não encontre as desejadas terras ou ilhas, então “(...) Nós enviaremos, com o dito Fernão Dulmo, homens e esquadras de barcos com poder Nosso para efectuar o mesmo...”, sendo que competiria sempre ao flamengo o comando dessa e de qualquer outra iniciativa. Por outro lado, e em caso de êxito, o monarca prometeu a Dulmo “os títulos de honra que nos parecerem justos”.

Este empenho de D. João II contrasta em muito com a sua recusa em aceitar a proposta de Colombo apenas dois anos antes. Segundo S. E. Morison, tal poderá ser explicado pelo facto de Colombo ter apresentado grandes despesas e exigido privilégios maiores que aqueles a que o monarca estava habituado a conceder. Por outro lado, e contrariamente a Colombo, Dulmo propôs concretizar o seu projecto a extensas próprias, pelo que o monarca não teria de desviar recursos e capitais da exploração do litoral africano.

Obtida a autorização régia, passados três meses Dulmo resolve associar-se a João Afonso do Estreito, do Funchal, solicitando ao monarca o reconhecimento do seu parceiro no projecto e na divisão dos eventuais proveitos daí resultantes. A autorização régia foi dada nas cartas de 24 de Julho e 4 de Agosto de 1486. Mas, para além da confirmação da parceria entre Dulmo e Estreito, D. João II estabeleceu condições precisas para este projecto, nomeadamente no que diz respeito aos recursos necessários para a sua realização e à participação do madeirense. A Estreito competia armar e aprovisionar para seis meses duas caravelas, ficando com o comando de uma delas, sendo a outra capitaneada por Dulmo, que deveria contratar pilotos e marinheiros para os dois navios, sendo sua a responsabilidade do pagamento dos seus salários. Entre estas e outras recomendações, o monarca ordenou também que a frota deveria estar pronta  a navegar no primeiro dia de Março de 1487. Segundo Luís de Albuquerque, esta é a primeira viagem projectada de forma clara e objectiva que conhecemos com o objectivo de explorar o Atlântico Ocidental.

Do resultado desta expedição nada sabemos, nem mesmo se alguma vez chegou a partir. Uma única referência à possível viagem de Dulmo e Estreito surge com Las Casas, o qual relata a descrição feita por um marinheiro galego a Cristóvão Colombo de uma viagem por si realizada, durante a qual terá avistado terra firme a oeste da Irlanda, a qual seria a que um Hérnan Dolinos (provavelmente Fernão Dulmo) teria procurado descobrir. No entanto, este breve apontamento é insuficiente para considerarmos a realização desta viagem, uma vez que não existem quaisquer reflexos desta ou de qualquer outra viagem para ocidente na cartografia e na documentação portuguesa conhecida imediatamente posterior a 1487.

Bruno Gonçalves Neves


Bibliografia
ALBUQUERQUE, Luís de, Estudos de História. Vol. V, Coimbra, [s.n.], 1977.
MORISON, S. E., As Viagens Portuguesas à América, Lisboa, Editorial Teorema e O Jornal, [s.d.].

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