Revista Digital sobre Tradução - Número 1- Maio 2002

Artigo (4.ª e última parte)


Jurabaça

Embora com menor presença nas fontes de estudo do que os termos anteriores, importa ainda referir o termo jurabaça, também ele utilizado para designar o intérprete. O termo é uma transcrição do malaio (jurubahasa), junção de dois termos que designa o ‘perito em língua’. O documento mais antigo que conhecemos onde o termo é utilizado remete-nos para a primeira embaixada oficial à China, que partira de Malaca em 1517 e levava por embaixador Tomé Pires.

A embaixada não atinge os objectivos pretendidos, tendo os seus membros sido presos e, mais tarde, alguns deles foram executados. Tomé Pires faleceu em 1524. Deste mesmo ano data a carta escrita por Cristóvão Vieira - que nela diz ser “perseo d’Ormuz” - elemento da embaixada de Tomé Pires e que se encontrava na prisão de Cantão no momento em que escrevia a referida carta. O autor da carta atesta a presença de “cinquo jurabaças” junto dos portugueses e noticia da seguinte forma a ‘sorte’ que os esperava:

O jurabaça grãde falleceo de doença os quatro forão em Pequim descabeçados por sairem fora da terra que trouxerão Portugueses a terra de China.
(Cristóvão Vieira, Carta de Cantão, in Raffaella DIntino, Enformação das Cousas da China, Textos do Séo Vieira, “Carta de Cantão”, in Raffaella D’Intino, Enformação das Cousas da China, Textos do Século XVI, Lisboa: I N C M, 1989, p. 20) 

Apesar da importância desta carta, faltam-nos outros dados que confirmem o uso do termo no quotidiano dos falantes do Português da região, ou das regiões mais próximas, de origem do vocábulo.

O termo é 'traduzido' para "gimbaca" na carta que o jesuíta Mestre Belchior escreveu de Macau aos irmãos do Colégio de Goa em 1555, publicada na obra acima referida. Porém, como constatámos há pouco, o termo língua é, sem dúvida, dominante durante todo o século XVI, mesmo na generalidade das crónicas e relatos dos contactos com a China.

De muitos turgimães, línguas e jurabaças desconhecemos tudo, inclusive o nome próprio. Estas designações atestam, no entanto, uma presença de homens no fazer da História. Por estas designações os lembramos.

Carlos Castilho Pais

© Instituto Camões, 2002