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Revista Digital sobre Tradução - Número 1- Maio 2002 |
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Dicionário dos tradutores e intérpretes de
Língua Portuguesa João
Garrido João Garrido era natural da Guiné e escravo. Tudo o que
conhecemos sobre João Garrido consta da carta que lhe concede a
alforria. Este documento diz-nos que o escravo João Garrido pertencia
ao escudeiro Gonçalo Toscano e que, por ocasião da sua última viagem
à Guiné, decidiu permanecer por lá por desejar ser homem livre. Uma
vez que a carta indica Gonçalo Toscano como morador da vila de Lagos,
é muito provável que João Garrido também aí morasse. Mas não
sabemos quando aí chegou. O que é certo é que era cristão, sabia
falar português e alguma língua africana, condições indispensáveis
para poder embarcar nas caravelas com o propósito de servir de língua.
Desconhecemos também o número de viagens que João Garrido terá
efectuado na qualidade de língua. Sendo a carta de alforria datada de 18 de Agosto de 1477,
temos que admitir que as viagens de João Garrido à Guiné se
realizaram durante o reinado de D. Afonso V. Todavia, nos relatos desses
viagens, ou nos relatos das viagens seguintes, o nome de João Garrido
não aparece transcrito. Publica-se, em seguida, a carta que temos vindo a referir,
pela qual o Príncipe D. João, futuro D. João II, concede a João
Garrido o que solicitara – a alforria –, atendendo aos serviços que
este prestara e ainda poderá prestar nos “tratos da Guiné”. Fonte: ANTT,
Chancelaria da Ordem de S. Tiago, liv. 1º, fl. 64
Dom João &. A quantos esta nossa
carta virem fazemos saber que a nós enviou dizer João Garrido, que ora
está em Guiné, que ele fora trazido a estes Reinos pelas caravelas que
lá vão resgatar e que o houvera cá por seu escravo Gonçalo Toscano,
escudeiro, morador em a nossa vila de Lagos, e que depois ele se tornara
cristão e fora algumas vezes por língua à Guiné e da derradeira vez
que lá fora ficara lá não por mais tornar-se (original:
tornase) mouro nem viver como mouro, mas por desejar de ser forro e não
tornasse mais a ser escravo do dito Gonçalo Toscano, e que ele se viria
logo a estes Reinos e nos serviria cá e em Guiné como bom e leal sujeito
natural deles. E nós considerando como nos podemos muito servir do dito
João Garrido em os tratos da Guiné, por ele ser dela natural e como o
dito Gonçalo Toscano não tem azo nem poder para o cobrar e haver-se se
ele por si não quiser tornar a este Reino e de si como somos inteiramente
conformado que ele em alguma maneira se não quer cá tornar sem ser forro
e de todo fora do senhorio e obrigação do dito Gonçalo Toscano, e assim
não no fazendo nós forro o dito Gonçalo Toscano não ganharia cousa
alguma e nós perderíamos serviço e proveito que dele e por ele
pudéramos haver, porém determinamos de todavia o fazermos forro e lhe
encomendar-nos (sic) que se
venha a nós, e por esta carta nós por poder de Rei que em este Reino por
comissão e autoridade del-Rei meu senhor temos, entendendo que em isto
fazemos serviço ao dito senhor e bem ao público destes Reinos dando para
ele bom avisamento aos tratos da Guiné de que a eles vêm tanto proveito,
determinamos de ele ser forro e o tirarmos, como de feito tiramos, do
senhorio do dito Gonçalo Toscano e queremos que ele se possa vir a estes
Reinos e livre e como livre sem reconhecer do dito Gonçalo Toscano por
senhor assim em sua pessoa como em nas cousas que por suas trouver, assim
ouro como escravos como outras quaisquer cousas de guisa que o dito
Gonçalo Toscano ou outro algum as não possam demandar nem haver, por
dizerem que o dito João Garrido é seu servo e por conseguinte as ditas
cousas suas que ele de lá trouver por dizerem que são suas deles, mas
ele as possa ter e tenha e logre por suas como se sempre fora cristão e
livre e nunca servo, a ainda nos praz, por lhe fazermos mais mercê e
favor que nos não pague quarto nem outro algum direito que por respeito
de Guiné nos haja de pagar das ditas cousas que assim trouver mas que
tudo logre e tenha em si livremente como dito é. Porém mandamos a todas
as justiças... Dada em a cidade de Évora a 18 dias – de Agosto –
João Lopes a fez – ano de 1477. E isto contando que ele se venha a
estes Reinos em alguma das ditas caravelas que este ano forem de cá à
Guiné. |
Carlos Castilho Pais