COMEMORAÇÕES

Ao longo do ano 2001 comemora-se o centenário do nascimento de Vitorino Nemésio. Serão, igualmente, comemorados os nascimentos de José Rodrigues Miguéis e José Régio.

Vitorino Nemésio: 1901-1978

Vitorino Nemésio nasceu em Praia da Vitória, Ilha Terceira, Açores, a 19 de Dezembro de 1901. A infância e a adolescência foram vividas na cidade de Angra do Heroísmo. Após os estudos liceais, matriculou-se na Faculdade de Direito de Coimbra, mas acabou por se licenciar em Filologia Românica. A partir de 1940 foi professor catedrático da Faculdade de Letras de Lisboa. Colaborou com a revista «Presença» e, após ter leccionado nas Universidades de Montpellier e de Bruxelas, fundou, em 1937, a importante «Revista de Portugal». Escreveu inúmeras crónicas para os jornais e participou em programas emitidos pela rádio e pela televisão. Destacam-se as conversas que manteve com os telespectadores, nos anos setenta, intituladas «Se bem me lembro». Paralelamente a esta actividade, foi erguendo uma vasta obra que, no domínio da poesia, é considerada uma das mais importantes da literatura portuguesa. Na ficção, o romance «Mau Tempo No Canal» é a sua obra-prima e «encarna a alma popular das Ilhas» (Óscar Lopes). Morreu em Lisboa, em 1978.

 

Navio de sal
Quando eu era pequeno, vinha o navio de sal,
Era um acontecimento!
E meu tio António Machado ia sempre ao areal
Com o seu óculo de alcance desencanudado a barlavento.
Era um iate cheio de cordas e de velas,
Chamado Santo Amaro, o Veloz ou o Diligente,
E, como trazia o sal, que é o sabor das panelas,
Era esperado tal qual como se fosse um ausente.
Na barra do horizonte era um ponto sozinho,
Mas crescia no vento a sua vela crua,
E o sol, ao morrer, tingia-lhe de vinho
A proa que vestia a pau a vaga nua.
Ali vinha, do Alto, sem sextante nem erro,
Enchendo devagar as previstas derrotas,
E plantava no fundo a sua raiz de ferro
Fazendo abrir no céu como flores as gaivotas.
As raparigas sãs da ribeira do mar,
Que traziam na pele um aroma silvestre,
Punham os olhos muito compridos, a cismar,
Nas cordas que secavam as roupas íntimas do Mestre.
Os pescadores mediam com a linha das pestanas
O tamanho do Audaz, a sua popa alceira:
Nunca tinha arribado àquelas praias insulanas
Tanto pano de verga, tanto oleado, tanta madeira!
Por isso a Vila, abrindo nas rochas duras
A branca humanidade das suas nocturnas casas,
Se encostava ao bater daquelas velas escuras
Como o corpo de um pássaro se deixa levar pelas asas.
(...)

O Bicho Harmonioso (1938)

O Mar em Vitorino Nemésio
O mar em Nemésio surge como um princípio criador, uma realidade concreta – a qual transparece nas palavras ou imagens que acompanham a sua descrição: gaivotas, vagas, areias, ilhéus, dunas – e estende-se até nós como um cordão umbilical, entregando-nos a sua força geradora, o seu alimento.

Fernando Guimarães «A expressão simbólica em Vitorino Nemésio»,
in
Linguagem e Ideologia.

Curiosidades
Projecto Caligrafias : Sobre os poetas e artistas açorianos
http://www.instituto-camoes.pt/iniciativas/caligrafias.htm

© Instituto Camões, 2001