XIII

Anda, vou-te mostrar a terra

dos teus pais, avós, antepassados

tão antigos que os podes escolher.

Este aqui é noé, de barba por fazer;

meteu na arca puro e impuro, bem e mal,

inventou o vinho, homem melhor

da sua geração ( não é grande elogio ),

teve filhos, netos, é de crer que morreu.

Estoutro, não sei bem, era pirata na malásia.

Vês as colinas? São tuas, quando

as olhas a direito. Realmente tuas,

parte de um mundo teu.

Sim, isso são filosofias,

tens razão. ( E tem graça ao ter razão ).

Anda daí, vou mostrar-te o colete de forças

onde era costume, sabes, tratar casos assim.

 

António Franco Alexandre, Quatro Caprichos, Lisboa, Assírio & Alvim.


António Franco Alexandre


«Depende dos dias, às vezes detesto-os todos, 
às vezes gosto de todos...»
António Franco Alexandre, acerca de Quatro Caprichos

Nasceu em Viseu em 1944.
Estudou Matemática em vários países estrangeiros, fazendo investigação nessa área. Desde 1975 é professor de Filosofia na  Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Poeta significativo da actual poesia portuguesa, estreou-se na década de 60, apesar de apenas na década seguinte se ter afirmado com  um «discurso centralmente inovador», como o considerou Joaquim Manuel Magalhães, exemplo de uma prática de efeitos intelectuais e de meios semânticos a que se junta uma certa técnica  de distanciação narrativa. Herdou as diversificadas experiências de linguagem poética pós-poesia 61.
Da sua obra destacam-se Poemas (1996), reunindo a obra já publicada e alguns poemas inéditos, e Quatros Caprichos (1999), prémio APE de Poesia.

 

                         Para conhecer melhor o poeta 

                        

© Instituto Camões, 2001