Despedida Encanecida pátria de joelhos, aqui te deixo, exausto de sofrer-te. Vou de olhos secos, cegos de perder-te, sossegar ódios velhos. Vou destruir-te as lágrimas de rojos, nas mãos e mãos inertes. Aos que sabem a ciência de vender-te abandono os despojos. Vou procurar-te ao bafo de outra face quente, clara e agreste. Aconchego-te aos restos da minha pele gasta de afagar-te. Vou de jornada. Aceno um lenço breve e incerto. Voltarei, voltarei. Num gesto mais rebelde e sereno. Ergue os teus ombros, pátria de joelhos, olha-me bem nos olhos para ver-te. Quero levar-te e ter-te no meu ódio já velho. (Notícias do Bloqueio, Fascículos de Poesia 9, Porto, Março de 1962) José Augusto Seabra In Cem Poemas Portugueses do Adeus e da Saudade Org. de José Fanha e José J. Letria Lisboa, Terramar, 2002 |
||||||||||
|
||||||||||
JOSÉ AUGUSTO SEABRA Nasceu em 1937, no Porto. Poeta, ensaísta, investigador e doutrinário político, é licenciado em Direito e doutorado em Letras pela École des Hautes Études, de Paris. Até 1974, foi professor na Universidade de Vincennes, Paris, tendo regressado a Portugal, após o 25 de Abril, e ingressado como docente na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Foi fundador e director (com Maria da Glória Padrão e António José Saraiva) do Centro de Estudos Pessoanos e da revista Persona. Foi também embaixador da Unesco em Paris e professor catedrático convidado da Sorbona. Dirige a revista Nova Renascença e tem colaboração em publicações como Bandarra, Cadernos de Literatura, Colóquio/Letras, Gazeta Literária, Notícias do Bloqueio, Raiz e Utopia, Revista da Faculdade de Letras de Lisboa, Sílex, Vértice, etc. Iniciou a sua obra poética com a publicação de A Vida Toda, em 1961. Enquanto ensaísta e doutrinário, destacam-se os estudos pessoanos e a apresentação de temáticas relacionadas com o nosso modo de ser e estar no mundo, bem como as relações entre cultura e política. Algumas obras: Poesia A Vida Toda (1961) Os Sinais e a Origem (1967) Tempo Táctil (1972) Desmemória (1977) O Anjo (1980) Gramática Grega (1985) Do Nome de Deus (1990) Fragmentos do Delírio (1990) Epígrafes (1991) Enlace (1993) Ensaio Fernando Pessoa ou o Poetodrama (1974) Alexandre Herculano ou a cicatriz do exílio (1977) Portugal face à Europa: um horizonte cultural (1977) Um romântico no Porto (1982) O Heterotexto Pessoano (1985) Cultura e Política ou a Cidade e os Labirintos (1994) O coração do texto/ Le coeur du texte (1996) - edição bilingue Para ler o ensaio «Repensar a República». Os labirintos da cidade outro texto de José Augusto Seabra |
||||||||||
|
||||||||||
|
||||||||||