titletitleAtividades didáticas <subtitle type="text"></subtitle> <link rel="alternate" type="text/html" href="http://cvc.instituto-camoes.pt"/> <id>http://cvc.instituto-camoes.pt/</id> <updated>2025-01-21T17:28:26+00:00</updated> <author> <name>Centro Virtual Camões</name> <email>naoresponder.plataforma.cvc@fbapps.pt</email> </author> <generator uri="http://joomla.org" version="1.6">Joomla! - Open Source Content Management</generator> <link rel="self" type="application/atom+xml" href="http://cvc.instituto-camoes.pt/singularidades-de-uma-rapariga-loura-dp5.html?format=feed&type=atom"/> <entry> <title>Sabia que? <link rel="alternate" type="text/html" href="http://cvc.instituto-camoes.pt/singularidades-de-uma-rapariga-loura/sabia-que-50252-dp6.html"/> <published>2011-03-28T09:47:07+00:00</published> <updated>2011-03-28T09:47:07+00:00</updated> <id>http://cvc.instituto-camoes.pt/singularidades-de-uma-rapariga-loura/sabia-que-50252-dp6.html</id> <author> <name>Luís Morgado</name> <email>luis.morgado@instituto-camoes.pt</email> </author> <summary type="html"><p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">A  coleção de ourivesaria do<a href="http://mnmachadodecastro.imc-ip.pt/"> Museu Nacional de Machado de Castro </a>é considerada uma das mais completas do país.<br /><br />No Museu Machado de Castro, em Coimbra, encontram-se peças de ourivesaria muito antigas que são provenientes de mosteiros, conventos, da Sé de Coimbra e de doações de particulares. As peças ilustram aproximadamente dez séculos de história!<br /><br />Neste museu, poderá encontrar o Cálice de D. Gueda Mendes e as joias que pertenceram à Rainha D. Isabel (casada com o Rei D. Dinis em 1282). Poderá apreciar a riqueza artística dos bordados a ouro, sobre um fundo de seda, veludo ou cetim.<br /><br />Visite este museu e fique a conhecer as seguintes peças de ouro:</span></p> <p style="padding-left: 30px;"><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">Cruz de S. Teotónio, século XII.</span></p> <p style="padding-left: 30px;"><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">Relicário, séculos XIV-XV.</span></p> <p style="padding-left: 30px;"><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">Cálice do século XVI.<br /></span></p></summary> <content type="html"><p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">A  coleção de ourivesaria do<a href="http://mnmachadodecastro.imc-ip.pt/"> Museu Nacional de Machado de Castro </a>é considerada uma das mais completas do país.<br /><br />No Museu Machado de Castro, em Coimbra, encontram-se peças de ourivesaria muito antigas que são provenientes de mosteiros, conventos, da Sé de Coimbra e de doações de particulares. As peças ilustram aproximadamente dez séculos de história!<br /><br />Neste museu, poderá encontrar o Cálice de D. Gueda Mendes e as joias que pertenceram à Rainha D. Isabel (casada com o Rei D. Dinis em 1282). Poderá apreciar a riqueza artística dos bordados a ouro, sobre um fundo de seda, veludo ou cetim.<br /><br />Visite este museu e fique a conhecer as seguintes peças de ouro:</span></p> <p style="padding-left: 30px;"><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">Cruz de S. Teotónio, século XII.</span></p> <p style="padding-left: 30px;"><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">Relicário, séculos XIV-XV.</span></p> <p style="padding-left: 30px;"><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">Cálice do século XVI.<br /></span></p></content> <category term="Singularidades de uma Rapariga Loura" /> </entry> <entry> <title>Quem escreveu 2011-03-28T09:25:12+00:00 2011-03-28T09:25:12+00:00 http://cvc.instituto-camoes.pt/singularidades-de-uma-rapariga-loura/quem-escreveu-33503-dp8.html Luís Morgado luis.morgado@instituto-camoes.pt <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">EÇA DE QUEIRÓS (1845-1900)</span></p> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><br /><br />Eça de Queirós viveu intensamente o impacto das novas tendências literárias, artísticas, filosóficas e pedagógicas que se desenvolviam na Europa do final do século XIX (nomeadamente, na França e na Inglaterra). <br /><br />No excerto do conto <em>Singularidades de uma Rapariga Loura</em>, o leitor consegue, a partir da descrição das joias na montra da ourivesaria, visualizar «as cores» das palavras e percecionar o contraste dos diferentes brilhos. A riqueza da história convida  o leitor a estar  igualmente  atento à «análise psicológica» dos comportamentos das personagens e à simbologia dos «cenários».<br /><br />Para saber mais:<br /><br /> Realismo<br /> Eça de Queirós<br /> A biografia de Eça de Queirós<br /> Eça de Queirós na Imprensa<br /> http://www.instituto-camoes.pt/escritores/eca/noticias.htm<br /> http://www.instituto-camoes.pt/arquivos/arqveca.htm<br /> Referências bibliográficas<br /> Outras referências</span></p> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><br /></span></p> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">[Encontrar Links]</span></p> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">EÇA DE QUEIRÓS (1845-1900)</span></p> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><br /><br />Eça de Queirós viveu intensamente o impacto das novas tendências literárias, artísticas, filosóficas e pedagógicas que se desenvolviam na Europa do final do século XIX (nomeadamente, na França e na Inglaterra). <br /><br />No excerto do conto <em>Singularidades de uma Rapariga Loura</em>, o leitor consegue, a partir da descrição das joias na montra da ourivesaria, visualizar «as cores» das palavras e percecionar o contraste dos diferentes brilhos. A riqueza da história convida  o leitor a estar  igualmente  atento à «análise psicológica» dos comportamentos das personagens e à simbologia dos «cenários».<br /><br />Para saber mais:<br /><br /> Realismo<br /> Eça de Queirós<br /> A biografia de Eça de Queirós<br /> Eça de Queirós na Imprensa<br /> http://www.instituto-camoes.pt/escritores/eca/noticias.htm<br /> http://www.instituto-camoes.pt/arquivos/arqveca.htm<br /> Referências bibliográficas<br /> Outras referências</span></p> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><br /></span></p> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;">[Encontrar Links]</span></p> Ler o texto 2011-03-28T09:21:05+00:00 2011-03-28T09:21:05+00:00 http://cvc.instituto-camoes.pt/singularidades-de-uma-rapariga-loura/ler-o-texto-87181-dp5.html Luís Morgado luis.morgado@instituto-camoes.pt <span style="font-family: arial; font-size: x-small;">(...)<br />Macário estava então na plenitude do amor e da alegria.<br />Via o fim da sua vida preenchido, completo, radioso. Estava quase sempre em casa da noiva, e um dia andava-a acompanhando, em compras, pelas lojas. Ele mesmo lhe quisera fazer um pequeno presente, nesse dia. A mãe tinha ficado numa modista (1), num primeiro andar da Rua do Ouro, e eles tinham descido, alegremente, rindo, a um ourives que havia em baixo, no mesmo prédio, na loja.<br />O dia estava de Inverno, claro, fino, frio, com um grande céu azul-ferrete, profundo, luminoso, consolador.<br />- Que bonito dia! - disse Macário.<br />E com a noiva pelo braço, caminhou um pouco, ao comprido do passeio.<br />- Está! - disse ela. - Mas podem reparar, nós sós...<br />- Deixa, está tão bom...<br />- Não, não.<br />E Luísa arrastou-o brandamente para a loja do ourives.<br />Estava apenas um caixeiro, trigueiro(2), de cabelo hirsuto (3).<br />Macário disse-lhe:<br />- Queria ver anéis.<br />- Com pedras - disse Luísa - e o mais bonito.<br />- Sim, com pedras - disse Macário. - Ametista, granada. Enfim, o melhor.<br />E, no entanto, Luísa ia examinando as montras forradas de veludo azul, onde<br />reluziam as grossas pulseiras cravejadas, os grilhões, os colares de camafeus (4), os anéis de armas, as finas alianças, frágeis como o amor, e toda a cintilação da pesada ourivesaria.<br />- Vê, Luísa - disse Macário.<br />O caixeiro tinha estendido, na outra extremidade do balcão, em cima do vidro da montra, um reluzente espalhado de anéis de ouro, de pedras, lavrados, esmaltados; e Luísa, tomando-os e deixando-os com as pontas dos dedos, ia-os correndo e dizendo:<br />- É feio. É pesado. É largo.<br />- Vê este - disse-lhe Macário.<br />Era um anel de pequenas pérolas.<br />- É bonito - disse ela. - É lindo!<br />- Deixa ver se serve - disse Macário.<br />E tomando-lhe a mão, meteu-lhe o anel devagarinho, docemente, no dedo, e ela ria, com os seus brancos dentinhos finos, todos esmaltados.<br />- É muito largo - disse Macário. - Que pena !<br />- Aperta-se, querendo. Deixe a medida. Tem-no pronto amanhã.<br />- Boa ideia - disse Macário - sim senhor. Porque é muito bonito. Não é verdade? As pérolas muito iguais, muito claras. Muito bonito! E estes brincos? - acrescentou, indo ao fim do balcão, a outra montra. - Estes brincos com uma concha?<br />- Dez moedas - disse o caixeiro.<br />E, no entanto, Luísa continuava examinando os anéis, experimentando-os em todos os dedos, revolvendo aquela delicada montra, cintilante e preciosa.<br />Mas, de repente, o caixeiro fez-se muito pálido, e afirmou-se em Luísa, passando vagarosamente a mão pela cara.<br />- Bem - disse Macário, aproximando-se - então amanhã temos o anel pronto. A que horas?<br />0 caixeiro não respondeu e começou a olhar fixamente para Macário.<br />- A que horas?<br />- Ao meio-dia.<br />- Bem, adeus - disse Macário. E iam sair. Luísa trazia um vestido de lã azul, que arrastava um pouco, dando uma ondulação melodiosa ao seu passo, e as suas mãos pequeninas estavam escondidas num regalo(5) branco.<br />- Perdão! - disse de repente o caixeiro.<br />Macário voltou-se.<br />- 0 senhor não pagou.<br />Macário olhou para ele gravemente.<br />- Está claro que não. Amanhã venho buscar o anel, pago amanhã.<br />- Perdão! - disse o caixeiro. - Mas o outro...<br />- Qual outro? - disse Macário com uma voz surpreendida, adiantando-se para o balcão.<br />- Essa senhora sabe – disse o caixeiro. - Essa senhora sabe.<br />Macário tirou a carteira lentamente.<br />- Perdão, se há uma conta antiga...<br />O caixeiro abriu o balcão, e com um aspecto resoluto:<br />- Nada, meu caro senhor, é de agora. É um anel com dois brilhantes que aquela senhora leva.<br />- Eu! - disse Luísa, com a voz baixa, toda escarlate.<br />- Que é? Que está a dizer?<br />E Macário, pálido, com os dentes cerrados, contraído, fitava o caixeiro colericamente.<br />O caixeiro disse então:<br />- Essa senhora tirou dali um anel. - Macário ficou imóvel encarando-o. - Um anel com dois brilhantes. Vi perfeitamente. - O caixeiro estava tão excitado, que a sua voz gaguejava, prendia-se espessamente.- Essa senhora não sei quem é. E tirou-o dali...<br />Macário, maquinalmente, agarrou-lhe no braço, e voltando-se para Luísa, com a palavra abafada, gotas de suor na testa, lívido:<br />- Luísa, dize... - Mas a voz cortou-se-lhe.<br />- Eu... - disse ela. Mas estava trémula, assombrada, enfiada, descomposta.<br />E tinha deixado cair o regalo ao chão.<br />Macário veio para ela, agarrou-lhe no pulso fitando-a: e o seu aspecto era tão resoluto e tão imperioso, que ela meteu a mão no bolso, bruscamente, apavorada, e mostrando o anel:<br />- Não me faça mal - disse, encolhendo-se toda.<br />- Macário ficou com os braços caídos, o ar abstracto, os beiços brancos; mas de repente, dando um puxão ao casaco, recuperando-se, disse ao caixeiro:<br />- Tem razão. Era distracção. Está claro! Esta senhora tinha-se esquecido. É o anel. Sim, sim, senhor, evidentemente... Tem a bondade. Toma, filha, toma. Deixa estar, este senhor embrulha-o. Quanto custa?<br />- Abriu a carteira e pagou.<br />Depois apanhou o regalo, sacudiu-o brandamente, limpou os beiços com o lenço, deu o braço a Luísa e dizendo ao caixeiro: «Desculpe, desculpe», levou-a, inerte, passiva, extinta e aterrada.<br />Deram alguns passos na rua. Um largo sol aclarava o génio feliz: as seges passavam, rolando ao estalido do chicote: figuras risonhas passavam, conversando: os pregões ganiam os seus gritos alegres: um cavalheiro de calção de anta fazia ladear o seu cavalo, enfeitado de rosetas; e a rua estava cheia, ruidosa, viva, feliz e coberta de sol.<br />- Macário ia maquinalmente, como no fundo de um sonho. Parou a uma esquina. Tinha o braço de Luísa passado no seu; e via-lhe a mão pendente, ora de cera, com as veias docemente azuladas, os dedos finos e amorosos: era a mão direita, e aquela mão era a da sua noiva! E, instintivamente, leu o cartaz que anunciava para essa noite, «Palafoz em Saragoça».<br />De repente, soltando o braço de Luísa, disse-lhe baixo:<br />- Vai-te.<br />- Ouve!... - disse ela, com a cabeça toda inclinada.<br />- Vai-te. - E com a voz abafada e terrível: - Vai-te. Olha que chamo. Mando-te para o Aljube. Vai-te.<br />- Mas ouve, Jesus - disse ela.<br />- Vai-te! - E fez um gesto, com o punho cerrado.<br />- Pelo amor de Deus, não me batas aqui - disse ela, sufocada.<br />- Vai-te, podem reparar. Não chores. Olha que vêem. Vai-te!<br />E chegando-se para ela disse baixo:<br />- És uma ladra!<br />E voltando-lhe as costas, afastou-se, devagar, riscando o chão com a bengala.<br />À distância, voltou-se: ainda viu, através dos vultos, o seu vestido azul.<br />Como partiu nessa tarde para a província, não soube mais daquela rapariga loura.<br /><br /></span><span style="font-size: x-small;"> </span> <div style="text-align: right;"><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><em>Singularidades de Uma Rapariga Loura </em>in Obras de Eça de Queiroz – Contos, 20.ª edição, Livros do Brasil, Lisboa, s/d  - pp. 30-34.<br /><br /></span></div> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><br /></span></p> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><strong>Vocabulário:</strong><br /><br />(1) <em>modista</em>: mulher que tem por ofício fazer vestuário de senhoras.<br /><br />(2) um caixeiro <em>trigueiro</em>:  moreno ( tom de pele, olhos e cabelos escuros).<br /><br />(3) o cabelo estava <em>hirsuto</em>: o cabelo estava  longo e espesso.<br /><br />(4) os colares de <em>camafeus</em>: pedra preciosa, com duas camadas diferentes na cor, sobre uma das quais se lavrou uma figura em relevo, à qual serve de fundo a outra camada.<br /><br />(5) as mãos escondidas num <em>regalo </em>branco: utensílio, geralmente em pele, em que se resguardam do frio as mãos.</span></p> <span style="font-family: arial; font-size: x-small;">(...)<br />Macário estava então na plenitude do amor e da alegria.<br />Via o fim da sua vida preenchido, completo, radioso. Estava quase sempre em casa da noiva, e um dia andava-a acompanhando, em compras, pelas lojas. Ele mesmo lhe quisera fazer um pequeno presente, nesse dia. A mãe tinha ficado numa modista (1), num primeiro andar da Rua do Ouro, e eles tinham descido, alegremente, rindo, a um ourives que havia em baixo, no mesmo prédio, na loja.<br />O dia estava de Inverno, claro, fino, frio, com um grande céu azul-ferrete, profundo, luminoso, consolador.<br />- Que bonito dia! - disse Macário.<br />E com a noiva pelo braço, caminhou um pouco, ao comprido do passeio.<br />- Está! - disse ela. - Mas podem reparar, nós sós...<br />- Deixa, está tão bom...<br />- Não, não.<br />E Luísa arrastou-o brandamente para a loja do ourives.<br />Estava apenas um caixeiro, trigueiro(2), de cabelo hirsuto (3).<br />Macário disse-lhe:<br />- Queria ver anéis.<br />- Com pedras - disse Luísa - e o mais bonito.<br />- Sim, com pedras - disse Macário. - Ametista, granada. Enfim, o melhor.<br />E, no entanto, Luísa ia examinando as montras forradas de veludo azul, onde<br />reluziam as grossas pulseiras cravejadas, os grilhões, os colares de camafeus (4), os anéis de armas, as finas alianças, frágeis como o amor, e toda a cintilação da pesada ourivesaria.<br />- Vê, Luísa - disse Macário.<br />O caixeiro tinha estendido, na outra extremidade do balcão, em cima do vidro da montra, um reluzente espalhado de anéis de ouro, de pedras, lavrados, esmaltados; e Luísa, tomando-os e deixando-os com as pontas dos dedos, ia-os correndo e dizendo:<br />- É feio. É pesado. É largo.<br />- Vê este - disse-lhe Macário.<br />Era um anel de pequenas pérolas.<br />- É bonito - disse ela. - É lindo!<br />- Deixa ver se serve - disse Macário.<br />E tomando-lhe a mão, meteu-lhe o anel devagarinho, docemente, no dedo, e ela ria, com os seus brancos dentinhos finos, todos esmaltados.<br />- É muito largo - disse Macário. - Que pena !<br />- Aperta-se, querendo. Deixe a medida. Tem-no pronto amanhã.<br />- Boa ideia - disse Macário - sim senhor. Porque é muito bonito. Não é verdade? As pérolas muito iguais, muito claras. Muito bonito! E estes brincos? - acrescentou, indo ao fim do balcão, a outra montra. - Estes brincos com uma concha?<br />- Dez moedas - disse o caixeiro.<br />E, no entanto, Luísa continuava examinando os anéis, experimentando-os em todos os dedos, revolvendo aquela delicada montra, cintilante e preciosa.<br />Mas, de repente, o caixeiro fez-se muito pálido, e afirmou-se em Luísa, passando vagarosamente a mão pela cara.<br />- Bem - disse Macário, aproximando-se - então amanhã temos o anel pronto. A que horas?<br />0 caixeiro não respondeu e começou a olhar fixamente para Macário.<br />- A que horas?<br />- Ao meio-dia.<br />- Bem, adeus - disse Macário. E iam sair. Luísa trazia um vestido de lã azul, que arrastava um pouco, dando uma ondulação melodiosa ao seu passo, e as suas mãos pequeninas estavam escondidas num regalo(5) branco.<br />- Perdão! - disse de repente o caixeiro.<br />Macário voltou-se.<br />- 0 senhor não pagou.<br />Macário olhou para ele gravemente.<br />- Está claro que não. Amanhã venho buscar o anel, pago amanhã.<br />- Perdão! - disse o caixeiro. - Mas o outro...<br />- Qual outro? - disse Macário com uma voz surpreendida, adiantando-se para o balcão.<br />- Essa senhora sabe – disse o caixeiro. - Essa senhora sabe.<br />Macário tirou a carteira lentamente.<br />- Perdão, se há uma conta antiga...<br />O caixeiro abriu o balcão, e com um aspecto resoluto:<br />- Nada, meu caro senhor, é de agora. É um anel com dois brilhantes que aquela senhora leva.<br />- Eu! - disse Luísa, com a voz baixa, toda escarlate.<br />- Que é? Que está a dizer?<br />E Macário, pálido, com os dentes cerrados, contraído, fitava o caixeiro colericamente.<br />O caixeiro disse então:<br />- Essa senhora tirou dali um anel. - Macário ficou imóvel encarando-o. - Um anel com dois brilhantes. Vi perfeitamente. - O caixeiro estava tão excitado, que a sua voz gaguejava, prendia-se espessamente.- Essa senhora não sei quem é. E tirou-o dali...<br />Macário, maquinalmente, agarrou-lhe no braço, e voltando-se para Luísa, com a palavra abafada, gotas de suor na testa, lívido:<br />- Luísa, dize... - Mas a voz cortou-se-lhe.<br />- Eu... - disse ela. Mas estava trémula, assombrada, enfiada, descomposta.<br />E tinha deixado cair o regalo ao chão.<br />Macário veio para ela, agarrou-lhe no pulso fitando-a: e o seu aspecto era tão resoluto e tão imperioso, que ela meteu a mão no bolso, bruscamente, apavorada, e mostrando o anel:<br />- Não me faça mal - disse, encolhendo-se toda.<br />- Macário ficou com os braços caídos, o ar abstracto, os beiços brancos; mas de repente, dando um puxão ao casaco, recuperando-se, disse ao caixeiro:<br />- Tem razão. Era distracção. Está claro! Esta senhora tinha-se esquecido. É o anel. Sim, sim, senhor, evidentemente... Tem a bondade. Toma, filha, toma. Deixa estar, este senhor embrulha-o. Quanto custa?<br />- Abriu a carteira e pagou.<br />Depois apanhou o regalo, sacudiu-o brandamente, limpou os beiços com o lenço, deu o braço a Luísa e dizendo ao caixeiro: «Desculpe, desculpe», levou-a, inerte, passiva, extinta e aterrada.<br />Deram alguns passos na rua. Um largo sol aclarava o génio feliz: as seges passavam, rolando ao estalido do chicote: figuras risonhas passavam, conversando: os pregões ganiam os seus gritos alegres: um cavalheiro de calção de anta fazia ladear o seu cavalo, enfeitado de rosetas; e a rua estava cheia, ruidosa, viva, feliz e coberta de sol.<br />- Macário ia maquinalmente, como no fundo de um sonho. Parou a uma esquina. Tinha o braço de Luísa passado no seu; e via-lhe a mão pendente, ora de cera, com as veias docemente azuladas, os dedos finos e amorosos: era a mão direita, e aquela mão era a da sua noiva! E, instintivamente, leu o cartaz que anunciava para essa noite, «Palafoz em Saragoça».<br />De repente, soltando o braço de Luísa, disse-lhe baixo:<br />- Vai-te.<br />- Ouve!... - disse ela, com a cabeça toda inclinada.<br />- Vai-te. - E com a voz abafada e terrível: - Vai-te. Olha que chamo. Mando-te para o Aljube. Vai-te.<br />- Mas ouve, Jesus - disse ela.<br />- Vai-te! - E fez um gesto, com o punho cerrado.<br />- Pelo amor de Deus, não me batas aqui - disse ela, sufocada.<br />- Vai-te, podem reparar. Não chores. Olha que vêem. Vai-te!<br />E chegando-se para ela disse baixo:<br />- És uma ladra!<br />E voltando-lhe as costas, afastou-se, devagar, riscando o chão com a bengala.<br />À distância, voltou-se: ainda viu, através dos vultos, o seu vestido azul.<br />Como partiu nessa tarde para a província, não soube mais daquela rapariga loura.<br /><br /></span><span style="font-size: x-small;"> </span> <div style="text-align: right;"><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><em>Singularidades de Uma Rapariga Loura </em>in Obras de Eça de Queiroz – Contos, 20.ª edição, Livros do Brasil, Lisboa, s/d  - pp. 30-34.<br /><br /></span></div> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><br /></span></p> <p><span style="font-family: arial; font-size: x-small;"><strong>Vocabulário:</strong><br /><br />(1) <em>modista</em>: mulher que tem por ofício fazer vestuário de senhoras.<br /><br />(2) um caixeiro <em>trigueiro</em>:  moreno ( tom de pele, olhos e cabelos escuros).<br /><br />(3) o cabelo estava <em>hirsuto</em>: o cabelo estava  longo e espesso.<br /><br />(4) os colares de <em>camafeus</em>: pedra preciosa, com duas camadas diferentes na cor, sobre uma das quais se lavrou uma figura em relevo, à qual serve de fundo a outra camada.<br /><br />(5) as mãos escondidas num <em>regalo </em>branco: utensílio, geralmente em pele, em que se resguardam do frio as mãos.</span></p>