A DOBRAGEM - UMA APOSTA PERDIDA
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Opção com significativos reflexos industriais, artísticos e comerciais - porventura aquela em que, dum ponto de vista histórico ou mesmo na actualidade, o fonocinema continua a suscitar as maiores e mais radicais controvérsias - é a dobragem. Ela chegou até nós na época de 1935/36, quando os filmes portugueses, dirigidos por nova e talentosa geração de realizadores aqui nascidos, logravam já - a partir de A Severa (1931), de Leitão de Barros, ou de A Canção de Lisboa (1933), de Cottinelli Telmo - estimulantes resultados.

O primeiro dubbing efectuou-se sobre Son Excellence Antonin (1935), de Charles-Felix Tavano, produzido em França pela Lux, a que foi dado o título O Grande Nicolau. Associaram-se no projecto a distribuidora Filmes Império e a Tobis Portuguesa, com o apoio da congénere gaulesa, através dum registo no sistema patenteado Tobis Klang Film. Para o arrojado empreendimento, o administrador-delegado da Tobis, Campos Figueira, deslocou-se previamente a Nova Iorque, onde estudou as possibilidades, comprou equipamento e contratou técnicos. Na mira do negócio, estava ainda a colocação, desta e de próximas adaptações, no mercado brasileiro.

Quanto a O Grande Nicolau, a autoria dos diálogos pertenceu a José Galhardo e Alberto Barbosa, com base no original de Jean Deymon e René Pujol. A responsabilidade da sonorização coube a Paulo de Brito Aranha. Vasco Santana cedeu voz a Raymond Cordy em Nicolau, envolvendo-se ainda Hortense Luz, Rafael Marques, Filomena Lima, Alberto Ghira, Francisco Ribeiro/Ribeirinho e Armando Machado. A estreia decorreu no Odeon e no Palácio (Lisboa) e no Águia d’Ouro (Porto), em Janeiro de 1936, com assinalável sucesso de público. No entanto, porque a publicidade - referindo, embora, tratar-se de dobragem - salientava a participação daquelas populares vedetas, parte da assistência, incauta, protestaria por não os ver em acção... De qualquer forma, a modalidade não vingou, sobretudo por incapacidade tecnológica e por deficiências de sincronização, além da escassa rendibilidade económica.

Afinal, viriam a ensaiar-se outras potencialidades - circunstanciais algumas, mas com peculiar significado, quanto às referências criativas no meio lisboeta. É exemplo O Chapéu Florentino (1939), ou Der Florentiner Hut - filme alemão produzido pela Terra (Berlim), com realização de Wolfgang Liebeneiner. No elenco, destacavam-se Heinz Ruhmann, Herti Kirchner, Christl Mardayn ou Paul Henckels. Estes e mais elementos, normalmente constantes num genérico inicial, tiveram insólita divulgação para o público da capital - aquando da estreia de O Chapéu Florentino no Politeama, em Fevereiro de 1940.

De facto, a distribuidora Lisboa Filme produziu um prólogo em substituição das legendas de entrada, apresentado pelo popular Manuel Santos Carvalho. Disfarçado de homem-do-realejo, e - ao que se promocionou - «com a sua costumada graça e à-vontade», cabia-lhe citar o título, nome dos artífices e intérpretes, segundo uma indicação literária, em verso, concebida pelo escritor teatral e cinematográfico João Bastos. Embora anónima, a direcção deste sketch preambular - exposta por total ineditismo - terá pertencido ao prestigiado Arthur Duarte, com fortes e antigas ligações à indústria germânica. Aliás, fora a Terra Film a concretizar, em 1930, Amor no Ring, de Reinhold Schunzel - onde apareciam Duarte e José Santa (Camarão), levando ao ecrã as primeiras cenas faladas em português.


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