José Maria Rodrigues
(Gondim, 27-06-1857 - Lisboa, 20-01-1942) |
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Fotografia de José Maria Rodrigues [Revista da Faculdade de Letras [da Universidade] de Lisboa, 2.ª série, 8 (1-2), 1942, inter 6-7]
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Filho de um casal de lavradores, e parece que sobrinho-neto de Frei Joaquim de Santa Rosa de Viterbo, José Maria fez a instrução primária com um cónego local, Vaz de seu nome, e com ele se iniciaria nas humanidades. "[O seminário em] Braga e [a universidade em] Coimbra desenvolverão no moço estudante, depois de Valença, o conhecimento da língua latina e dar-lhe-ão também o saber helénico, pouco a pouco avolumado e aprofundado. Coimbra, à sua parte, ainda lhe dará o conhecimento do hebraico, acabando de fazer do aluno de Teologia [...] um derradeiro representante da preclara tradição renascentista dos filólogos trilingues" (Francisco Rebelo Gonçalves, [1957], "Evocação de José Maria Rodrigues", Obra completa, II, 1999, pp. 491-509, p. 500). Ainda aluno em Coimbra, participou na Questão da Sebenta (as peças de José Maria Rodrigues são Duas palavras ao sr. Camillo Castello Branco, As evasivas do sr. Camillo Castello Branco, A réplica do sr. Camillo Castello Branco, 1883; as de Camilo estão na Bohemia do espirito); mas em mais polémicas interveio com idêntico brilho: cabe aqui referir-se aquela em que teve como opositor Epifânio Dias; ou a sobre Camões e a Infanta D. Maria; ou a travada com Gago Coutinho sobre a rota de Vasco da Gama nos Lusíadas. Doutorado em Teologia, de 1888 a 1893 lecciona em Coimbra. Ocupa depois a reitoria do Liceu de Lisboa, até 1902, ou seja, durante a época em que se tratava de pôr em prática a reforma chamada de Jaime Moniz. Foi também preceptor dos príncipes. No ano lectivo de 1901-2 vemo-lo regressar definitivamente ao ensino universitário, agora no Curso Superior de Letras (e, a partir de 1911, na sucessora Faculdade de Letras de Lisboa). Leccionaria, com invulgares dotes pedagógicos, as diversas cadeiras de filologia clássica, a cadeira de Estudos Camonianos (depois de ter começado por dar um curso livre sobre os Lusíadas), e até Literatura Nacional (em 1910/11) e Línguas e Literaturas Alemã e Inglesa (1903/4).
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José Maria Rodrigues em S. Pedro de Muel, na casa de Afonso Lopes Vieira. Com o poeta colaborou Rodrigues nas edições nacionais - de divulgação - da épica (1929) e da lírica de Camões (1932) [Albino Forjaz de Sampaio (dir.), História da Literatura Portuguesa Ilustrada, II, 1930, p. 364]
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Na sua bibliografia avulta a obra de camoniana - a peça mais importante são as Fontes dos Lusíadas (separata do Instituto; 1908; 2.ª ed.: 1979); em "Algumas observações a uma edição comentada dos Lusíadas", 1915, ter-se-á superiorizado a Epifânio sobre que se ocupa a crítica. Os trabalhos retintamente linguísticos, além de pouco avantajados - artigos em revistas -, são raros (As frases do tipo "tenho dó de si", "vou consigo": sua origem e legitimidade, 1892; Sobre um dos usos do pronome "se": as frases do tipo "vê-se sinais", 1914; O imperfeito do conjuntivo e o infinito pessoal no português, 1914). Hernâni Cidade resume com agudeza a sua característica: "os estudos sôbre o português, não prescindindo embora do conhecimento [do latim e do grego], hão-de ser feitos sobretudo em textos portugueses e, mais de uma vez, tendo bem presente o facto da autonomia da língua em relação aos quadros lógicos criados pelos gramáticos gregos e latinos. [...] atentava, minucioso, em quanto ilogismo deparava na sintaxe do português clássico, jamais esquecido de que a língua é expressão da vida e de que a vida não cabe na lógica, como as formas da natureza não cabem nas figuras de geometria. Isso lhe permitiu, por exemplo, descobrir vestígios do imperfeito do conjuntivo latino, que os filólogos de todo o mundo afirmavam ter desaparecido de tôdas as línguas com excepção de uma -, o lugodorês - em frases que um purista arredaria da sua atenção como solecismos insuportáveis, apesar de subscritas por alguns dos escritores quinhentistas" ("Prof. Doutor José Maria Rodrigues", Revista da Faculdade de Letras [da Universidade] de Lisboa, 2.ª série, 8 (1-2), 1942, pp. 6-11).
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