Selos Científicos

Selos dedicados a Pedro Nunes comemoram as criações do matemático

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Pedro Nunes é uma personagem filatélica em vários selos que os correios lhe dedicaram. O primeiro contendo uma imagem do matemático será provavelmente um exemplar de 1924 dedicado a Camões, em que se reproduz uma imagem da estátua do poeta existente em Lisboa. Pedro Nunes, por estar representado entre as personagens que ladeiam a estátua, aí aparece também, embora em posição secundária. Dois selos especialmente dedicados ao matemático apareceram no quarto centenário da sua morte, em 1978. Já em 2002, comemorando-se 500 anos sobre o seu nascimento, os CTT dedicaram-lhe três novos selos. Através desta estampilhas, o nosso antigo cosmógrafo-mor tem viajado por todo o mundo, levando a partes remotas o seu nome e algumas imagens das suas criações, nomeadamente a curva loxodrómica e o nónio.

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Os selos de 1978 eram dois. Um de 5$00 e outro de 20$00. No primeiro aparece uma imagem de alguém que poderá ter alguma parecença com Pedro Nunes. Não se trata do nosso cientista, pois não existem gravuras da época que o reproduzam. Trata-se pois de uma imagem inventada, mas verosímil. Aparecem ainda algumas equações, simbolizando o trabalho de álgebra do matemático, que se vê a desenhar curvas e apreciar um esboço. No fundo, aparece um globo, na altura mais conhecido por poma, e que era sobretudo um instrumento matemático para proceder a cálculos e à visualização de conceitos de geometria esférica. Nessa poma notam-se algumas curvas, possivelmente evocando a proposta de Pedro Nunes para se medir a latitude de um lugar através da tomada de duas alturas extrameridianas do Sol.

No selo de 20$00 aparece uma imagem dum quadrante com 45 escalas concêntricas que permitiam medir um ângulo, habitualmente de altura de um astro, com uma precisão superior à de qualquer das escalas individuais. Trata-se de um nónio, instrumento proposto por Pedro Nunes e uma das maiores criações do matemático. À direita encontram-se a projecção sobre um plano de curvas de rumo, ou loxodrómicas.

As curvas loxodrómicas constituem uma das grandes descobertas de Pedro Nunes. Aparecem primeiramente na sua obra Tratado sobre certas dúvidas da navegação, de 1537. Nessa obra, o matemático discute a linha de rumo que um navio traça se seguir uma direcção cardeal constante, por exemplo, se rumar sempre para noroeste. Julgava-se na altura que um navio que seguisse uma rota desse tipo, sempre ditada pela mesma inclinação da bússola, viajaria pelo caminho mais curto entre dois pontos do globo. Pedro Nunes mostrou que isso não é verdade e que, com excepção de rotas sobre o mesmo meridiano ou ao longo de um paralelo, esse rumo é uma espiral que dá infinitas voltas ao globo e que converge para um dos pólos. Essa linha não segue pois a distância mais curta entre dois pontos, que seria um arco de círculo máximo. Foi o conhecimento das loxodrómicas que permitiu a Mercator a construção do sistema de projecção de mapas que tem o seu nome e que ainda hoje é dos mais utilizados.

Em 2002 apareceram três novos selos que retomam estes temas. A moeda agora já não é o escudo, como em 1978, mas sim o euro.

No selo de € 0,28, da esquerda na imagem, estão traçadas espirais loxodrómicas estilizadas, tanto no espaço como sobre um globo. Estas últimas espirais prolongam-se sobre o selo central, de € 1,15, onde aparece uma imagem de alguém que de novo se imagina ser Pedro Nunes. Talvez não seja por acaso que o desenhador escolheu uma face semelhante à do selo de 1978.

No terceiro selo, o de € 0,28, à direita, aparece em primeiro plano um quadrante e, em fundo, as linhas das escalas que nele estão gravadas. O instrumento é o único da época dotado de nónio e que sobrevive. Trata-se de uma peça descoberta nos anos 90, em Florença, pelo comandante Estácio dos Reis. Tal como no selo de 1978, as escalas desse quadrante estão graduadas segundo o processo original de Pedro Nunes, que veio a ser conhecido como nónio. São 45 escalas circulares concêntricas que, no seu conjunto, permitem aumentar a precisão do instrumento. A versão mais conhecida do nónio é outra. Consiste em duas escalas, uma fixa e outra móvel, tal como o francês Pierre Vernier posteriormente propôs com base no invento do nosso matemático.

É interessante comparar os selos de 1978 com os de 2002. Não só a técnica e o estilo de desenho evoluíram, acompanhando as tendências da arte, como a moeda mudou. Mas o mais importante é que em 2002 passou a ser possível introduzir o desenho de um instrumento real dotado do nónio. Neste ano passou também a ser possível observar em Lisboa uma réplica desse instrumento. O modelo, à escala original e dotado de todos os seus componentes encontra-se no Museu de Marinha, em Lisboa. Pedro Nunes deu-nos mais uma razão para visitar o museu dos Jerónimos.

 

Nuno Crato


© Instituto Camões 2003