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António Soares Barbosa
Professor de Filosofia (n. Ansião, 1734-m. Coimbra, 1801), estudou no Seminário de Coimbra e na respectiva Universidade, onde se formou em Cânones. Foi um dos quatro principais professores de Filosofia após o decreto de expulsão dos Jesuítas. Em 1772 foi nomeado lente de Lógica, Metafísica e Ética na Faculdade de Filosofia, reformada pelos Estatutos desse mesmo ano e, em 1791, é nomeado decano e director da mesma Faculdade.
São fundamentalmente duas as obras que o fizeram sobressair no panorama intelectual da sua época: o Discurso sobre o bom e verdadeiro gosto na Filosofia (1776) e o Tratado Elementar de Filosofia Moral (1792), ambas elaboradas dentro dos princípios da corrente das Luzes.
Na primeira das obras, a ideia de um bom gosto na Filosofia converte-se num discurso sobre o método à luz do «matematismo» reinante. Na corrente das «Luzes» a noção de «método» está ligada a uma razão argumentativa e ao discurso de intenção pedagógica, integrada enquanto quarta e última parte da Lógica. Nesse sentido, define-se como a ordem de disposição dos argumentos, na base da clareza e simplicidade, a partir da qual se pretende estipular uma noção de «ordem natural» do discurso ou «ordem da razão», «tirada da contínua observação das operações da nossa alma» (Discurso..., p. 17). Ressalta assim o primado de uma Lógica de carácter profundamente psicologista, no quadro do pedagogismo imperante. A proximidade e mesmo a equivalência que Barbosa estabelece entre método e gosto, usando, por vezes, indistintamente um e outro termo, assenta, em última análise, na tese de Muratori nas Riflessioni sopra il Buon Gusto, onde o gosto é associado ao nobilissimo pregio dell'Ordine» sob o exemplo da Matemática que ensina «a bene dividere e ordinare le cognizioni e le cose» (parte I, capítulo III). O método e, portanto, o bom gosto, é considerado no Discurso... como a única servidão admissível ao filósofo, pois se traduz na superação da obscuridade do raciocínio e nos confere o modo correcto de dirigir as operações da nossa mente, possibilitando o «progresso» do conhecimento. A respeito de Newton, p. ex., dirá que mais importante que conhecer as suas doutrinas é saber o método por que as constituiu, referindo-se ao comum desejo dos teóricos das «Luzes» em generalizarem às operações da mente as vias analítica e sintética, definidas na Óptica.
Quanto ao Tratado, toda a exposição que nos oferece da Filosofia Moral é de molde a sublinhar a sua dependência perante a teoria do direito natural moderno e continua ideias fundamentais já expressas na parte final do Discurso... Analisando o que se deve entender por natureza (humana) na Moral e no Direito, ataca os que, neste âmbito, prescindem de Deus, «pondo a Natureza por única legisladora». O Tratado expõe, sob especial influência de Burlamaqui, as «Obrigações do homem deduzidos dos princípios da Lei Natural Primitiva», para com Deus, para consigo próprio e, finalmente, para com o conjunto do género humano, adoptando um estilo claro que não se coíbe de percorrer as várias correntes de opiniões do período moderno (Grócio, Puffendorf, Heinécio ... ) com intuito predominantemente didáctico. Segundo Cabral de Moncada, foi esta a obra mais notável que em Portugal se publicou sobre Filosofia do Direito no final do séc. XVIII e até cerca de meados do séc. XIX. Apesar do panorama erudito e ecléctico que aí apresenta, começa já a manifestar-se com Soares Barbosa, nesta obra, uma reacção ao nacionalismo iluminista tal como este se exprimira nos Estatutos da Universidade de Coimbra (1772) e na obra de Martini: nega as teorias contratualistas a respeito da sociedade civil; a existência de um estado de natureza anterior de absoluta igualdade e liberdade; a absoluta independência da razão, assim como a existência de um princípio racional único como fonte primária de todo o Direito.
Obras Principais
Opusculum Philosophicum ad usum Tyranum elocubratum (1758); Discurso sobre o bom e verdadeiro gosto na Philosophia, (1766); Tractado Elementar de Philosophia Moral, 3 tt. (1792).
Bibliografia
Luís Cabral de Moncada, Subsídios para Uma História da Filosofia do Direito em Portugal (1772-1911), Coimbra, 1938, sobretudo p. 24; J. S. da Silva Dias, Portugal e a Cultura Europeia (Séculos XVI a XVIII), Coimbra, 1953; José Esteves Pereira, «Natureza e Expressão do Saber», in Prelo, n.º4, 1984, pp. 71 a 84.
Pedro Calafate
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