António Alves Redol

(Vila Franca de Xira, 29-12-1911 – Lisboa, 29-11-1969)

Através do teatro, como das demais vertentes da sua criação artística, António Alves Redol empenhou-se na educação do povo, procurando contribuir, num contexto de censura e repressão, para a sua mobilização e tomada de consciência.

  Alves Redol, Freixial, 1950 [cortesia do Museu do Neo-Realismo]
  Alves Redol, Freixial, 1950 [cortesia do Museu do Neo-Realismo]

Autor de Gaibéus (1939), considerado o romance inaugural da vertente literária do Neo-Realismo português, é reconhecido como um dos mais representativos escritores daquele movimento ideológico, cultural e artístico, que emergiu geograficamente disperso em meados dos anos 30, no contexto da ditadura salazarista e da indignação perante acontecimentos internacionais, de que se destacava a Guerra Civil de Espanha (1936-39).

Nascido num ambiente suburbano de grande dinamismo operário e associativo, cedo integrou os corpos gerentes de várias coletividades de recreio de Vila Franca de Xira. Nessas estruturas locais, de natureza socio-cultural, participou como ator amador em quatro espetáculos, entre 1928 e 1934, no último dos quais, a revista Bela Dona (levada à cena após a sua estadia de três anos em Angola, onde inicia a sua formação “socialista”), transparecia já a dimensão politizante que viria a atravessar toda a sua atividade artístico-literária.

No final da década de 30, no âmbito do Grupo Neo-Realista de Vila Franca, participou nos “serões de arte” (com manifestações artísticas e palestras em que emergia a doutrina marxista), proibidos pela Censura, que os considerou dissonantes da “Política do Espírito” de António Ferro. A noção do espaço cénico e a atração pela conceção global do espetáculo – que alguma da sua criação dramática, designadamente no texto didascálico, viria a evidenciar – conduziram-no várias vezes, até aos anos 50, à organização de espetáculos, com atores amadores e profissionais, na sua terra natal e noutras localidades, entre as quais a Nazaré.

Assumiu-se como dramaturgo com Maria Emília, “peça em um acto” publicada na revista Vértice (maio de 1945) e escolhida, no ano seguinte, para o primeiro espetáculo “essencialista” do Teatro Estúdio do Salitre, com encenação de António Vitorino. Publicou em livro mais três peças: a “tragédia” Forja (1948), cuja montagem cénica em Portugal só foi autorizada pela Censura cerca de vinte e um anos mais tarde, no Teatro Laura Alves, com encenação de Jorge Listopad; a “sugestão para um divertimento popular” O destino morreu de repente (1967), parcialmente integrada em 1976 no espetáculo O meu caso + O destino morreu de repente, do Teatro de Animação de Setúbal, dirigido por Carlos César, e estreado na íntegra pela Comuna Teatro de Pesquisa, em 1988, com encenação de João Mota; e o drama Fronteira fechada (publicado postumamente em 1972), levado à cena pela primeira vez na Sociedade Operária de Instrução e Recreio Joaquim António de Aguiar, em Évora, em 1973. A sua obra dramática divulgada inclui ainda três peças breves, escritas propositadamente para a cena: Porto de todo o mundo (1943) e De braços abertos para a natureza (1950), ambas representadas no âmbito do movimento campista; e O menino dos olhos verdes (1950), destinada à estreia de Laura Alves como “actriz dramática”.

A sua aproximação ao teatro fez-se também por via da ensaística, tendo publicado, entre outros textos, também em periódicos, uma recolha sobre o tradicional Bicho do Entrudo, em Glória – Uma aldeia do Ribatejo (1938), uma reflexão sobre o teatro levado à cena na França da “Libération”, em A França – Da resistência à renascença (1947), e os prefácios às suas peças publicadas na década de 60, em particular aquele que acompanha O destino morreu de repente. É nestes textos, de modo explícito e sistematizado, mas principalmente nas suas peças, nas opções formais que convoca e na dialética que nelas estabelece com a interpelação do real, que se revelam as mais importantes referências do seu teatro, que vão da matriz naturalista (aliás, ideologicamente paradoxal) até ao teatro político de Erwin Piscator e à dramaturgia épica brechtiana, passando pelo teatro popular de Firmin Gémier e Romain Rolland, pelo teatro poético e socialmente comprometido de Federico García Lorca ou pelo drama de alcance social de Henrik Ibsen, George Bernard Shaw ou Arthur Miller.

Durante décadas, colaborou no surgimento de vários coletivos teatrais, de entre os quais se destacam, em 1946, o Teatro Estúdio do Salitre (com Gino Saviotti, Vasco Mendonça Alves e Luiz Francisco Rebello, entre outros) e, em 1969, o Primeiro Acto (dirigido por Armando Caldas). Morreu após um internamento hospitalar prolongado, a uma semana da estreia absoluta de Forja, que considerava “um dos mais belos momentos” da sua vida de escritor.

 

Textos de/para teatro

1945: Maria Emília, in Vértice, Maio, pp. 3-27.

1948: Forja. Lisboa: Edição de autor.

1966: Teatro I (Forja, Maria Emília). Mem Martins: Publicações Europa-América.

1967: O destino morreu de repente, in Teatro II. Mem Martins: Publicações Europa-América.

1972: Fronteira Fechada, in Teatro III. Mem Martins: Publicações Europa-América.

 

Bibliografia

FALCÃO, Miguel (2008). Espelho de ver por dentro: O percurso teatral de Alves Redol. Lisboa: Imprensa Nacional / Casa da Moeda.

REBELLO, Luiz Francisco (1996). “Para a História do Teatro Estúdio do Salitre” in Alves Redol  et.  al., Teatro Estúdio do Salitre: Lisboa, 50 anos. Lisboa: Sociedade Portuguesa de Autores/Publicações Dom Quixote, pp. 9-27.

 

Consultar a ficha de pessoa na CETbase:

http://ww3.fl.ul.pt/CETbase/reports/client/Report.htm?ObjType=Pessoa&ObjId=15200

Consultar imagens no OPSIS:

http://opsis.fl.ul.pt/

 

Miguel Falcão/Centro de Estudos de Teatro