João Rosa

(Lisboa, 18-04-1843 – Lisboa, 15-03-1910)

João Anastácio Rosa Júnior estreou-se como ator em 1862, no Teatro S. João, em Jóias de família de César de Lacerda. Foi uma das principais figuras da companhia Rosas & Brazão, bem como professor de Declamação no Conservatório.

  João Rosa
  João Rosa, s.d. [O Occidente, 20-11-1907, p.249]

Testemunhos recordam-no, frequentemente, como um ator coerente e profissional versado no estilo de representação naturalista. A doença afastou-o definitivamente do palco em 1906, ano em que se apresentou no Teatro D. Amélia em A Ceia dos Cardeais de Júlio Dantas.

Ator numa família de atores, filho de João Anastácio Rosa e irmão de Augusto Rosa , brincava, em pequenino, representando o que via e ouvia aos artistas, que às vezes o levavam a ver, e frequentava a casa da atriz Emília das Neves, com quem veio a contracenar mais tarde. Talvez devido a uma sua particularidade física, descrita por Fialho d’Almeida como “tardo da fala e com ameaços de gaguejos num ou noutro arranco de pronúncia”, o pai não queria que seguisse a carreira de ator, matriculando-o na Academia de Belas Artes, no curso de pintura, que frequentou com aproveitamento, até que se lhe tornou clara a vontade de fazer teatro. 

Estreou-se aos 19 anos, ao lado do pai, a 13 de novembro de 1862, no Teatro S. João do Porto, num espetáculo a partir da peça Jóias de família de César de Lacerda. Em Lisboa, subiu pela primeira vez ao palco do Teatro S. Carlos a 12 de agosto de 1863, no espetáculo Ricardo III (a partir de uma adaptação do texto de Shakespeare), no papel de Raul de Fulkes ou Scroop, e, do Teatro D. Maria II, a 31 de outubro de 1863, com a peça Sabina Maupin (a partir de Eugène Scribe), contracenando com os grandes atores e atrizes da escola romântica, como Emília das Neves, Manuela Rey, Tasso, José Carlos Santos e João Anastácio Rosa, entre outros. Em 1866, com a saída de parte do elenco, passou a desempenhar neste teatro os primeiros galãs amorosos, iniciando assim a sua fama de sedutor da cena portuguesa, sendo notado o seu trabalho n’Os fidalgos du Bois Doré (de Georges Sand e Paul Meurice), em 1864), e em papéis como o Marquês (d’O genro do Sr. Poirier de Émile Augier e Jules Sandeau, época de 1876/77), e Girard (d’A estrangeira de Dumas Filho, em 1880).

Em 1872, mudou-se para o Teatro do Ginásio, onde ficou até 1874. Apresentou-se depois no Teatro da Trindade (de 1874 a 1875), no Teatro Variedades (em 1875, com Lucinda Simões e Furtado Coelho), no Teatro do Príncipe Real (de 1875 a 1876, com o pai e Lucinda Simões), partindo depois para o Porto, contratado para o Teatro Baquet. Regressou ao Teatro D. Maria II, fazendo parte do elenco de 1876 a 1898, primeiro sob a empresa Biester, Brazão & C.ª (até 1880), depois como societário da Sociedade de Artistas Dramáticos Portugueses/ Brazão, Rosas & C.ª, e, posteriormente, na Rosas & Brazão. Neste teatro trabalhou com alguns dos atores mais reconhecidos na época: Augusto Rosa, Eduardo Brazão, Vírgínia, Rosa Damasceno, Pinto de Campos, Carolina Falco, Emília dos Anjos, Emília Cândida, Joaquim de Almeida, César de Lacerda, Augusto Antunes, António Pedro, Ferreira da Silva, Chaby Pinheiro, Lucinda do Carmo e Taborda, entre outros. De 1898 a 1906, finda a concessão do D. Maria à Rosas & Brazão, apresentou-se no Teatro D. Amélia.

A partir do ano letivo de 1885/1886 foi professor de Declamação no Conservatório, atividade esta documentada até ao ano de 1891/1892, não se encontrando, depois deste, registo sobre a matéria, havendo somente uma prova de que no ano letivo de 1902/1903 já não lecionava naquela instituição.

Foi descrito como um ator “moderno”, operando a transição das ideias e maneiras românticas para o naturalismo, na procura da verdade psicológica e social das personagens que representava (LIMA: 1911). Apesar da sua particularidade física, a sua maneira de dizer era natural e verdadeira (LIMA: 1911), adotando “o trabalho paciente de um tísico que quer fazer-se à viva força num ginasta” (ALMEIDA: 1894). Não procurou o brilho ou o efeito dramático fora do que era o seu empenho na composição de personagens estudando-as “por dentro” com exatidão e verdade (ROSA: 1915). Caíam-lhe nas mãos quase todos os “canastrões” que conseguia transformar em papéis deliciosos (BRAZÃO: 1925). Mantinha a mesma personagem desde a primeira à última apresentação, sabendo sempre o seu papel e dispensando o ponto (LIMA: 1911). Uma plateia cheia dava-lhe tanto ânimo para representar como meia dúzia de espectadores (LIMA: 1911).

Para Fialho de Almeida, contudo, era “como os demais colegas, uma miséria, não lendo um livro, não percebendo a linha psicológica de um papel”, embora com “uma espécie de instinto que por vezes lhe supre o que lhe falta”. Mesmo este crítico, que não tinha a certeza do talento de João Rosa (“conversado parecia que não, representado, às vezes parecia que sim”), destaca o desempenho que tem no Luís XI (ainda que mais tarde viesse a desvalorizar esta prestação) como “um caso sério”, cumprindo “fazer justiça ao talento dum homem, que, arvorando em qualidades todos os seus defeitos, dum só jacto esculpiu uma figura grande e bem tratada […], perante a qual se esquece o actor para ver só a personagem e dentro de cuja veemência de novo brilha, na alma do filho, a luminosíssima e radiosa centelha do génio do pai.” (ALMEIDA: 1888). Chega-nos a memória da sua interpretação no alcoólico com delirium tremens (Vida infernal, de Émile Gaboriau, em 1878), no Carlos V (Ernâni, de Vítor Hugo, na época de 1878/79), no Iago (Otelo, de Shakespeare, em 1882, nomeadamente na procura das várias inflexões para a frase “mete o dinheiro na bolsa”), no Cardeal Richelieu (de Edward Bulwer-Lytton, em 1884) e no seu último galã (Fogueiras de S. João, de Sudermann, em 1903), entre outros.

A nevrose, a neurastenia ou um esgotamento afastaram-no do palco, apresentando-se pela última vez, aos sessenta e três anos, n’A ceia dos cardeais, numa récita em benefício do irmão a 9 de abril de 1906. Na cidade de Lisboa, no carismático Bairro dos Actores da freguesia do Alto do Pina, há uma rua com o seu nome.

 

Bibliografia

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Consultar a ficha de pessoa na CETbase:

http://ww3.fl.ul.pt/CETbase/reports/client/Report.htm?ObjType=Pessoa&ObjId=23080

Consultar imagens no OPSIS:

http://opsis.fl.ul.pt/

 

Cláudia Oliveira/Centro de Estudos de Teatro