Teatro (Novo) da Rua dos Condes

(Rua dos Condes, Lisboa, Portugal: 1888-1951)

O Teatro “novo” da Rua dos Condes foi construído, em 1888, no local onde se encontra atualmente o edifício do Cinema Condes (hoje ocupado pelo Hard-Rock Café).

  Teatro Condes
  Teatro da Rua dos Condes (fachada), post. 1888 [Arquivo Municipal de Lisboa – Arquivo Fotográfico].

O edifício, da autoria de Dias da Silva, foi alvo de grandes remodelações: uma em 1898 e outra, já como cinema, em 1919. Foi primeiro propriedade de Francisco Grandella, mas passou, em 1916, para as mãos da firma Castello Lopes, ano em que veio a ser oficialmente denominado Cinema Condes. Enquanto teatro a sua estreia ocorreu a 23 de dezembro de 1888, com os espetáculos Ontem e hoje e As duas rainhas, antecedidos por um monólogo inaugural recitado pelo ator Taborda. Até 1915 – ano em que foi transformado em cinema – foi um espaço dedicado, principalmente, à opereta e ao teatro de revista. Foi demolido, em 1951, para dar lugar ao edifício do Cinema Condes, estrutura ainda hoje presente no lado nascente do início da Avenida da Liberdade.

Nos terrenos do velho Teatro da Rua dos Condes – demolido apenas em 1882 – foi construído, em 1888, um novo teatro, que ficou conhecido como o Teatro Novo da Rua dos Condes. Entre a demolição de um e a construção do outro, esteve em funcionamento, naquele mesmo lugar, entre 1883 e 1886, um pequeno teatro denominado Teatro-Chalet, comummente chamado “Chalet do Araújo”, nome retirado do seu proprietário: o ator Manoel José de Araújo. Todavia, os anos de atividade deste espaço estão envolvidos em alguma incerteza, uma vez que há autores, como Luís Soares Carneiro, que apontam como possibilidade que a sua demolição tenha ocorrido apenas em 1888 (CARNEIRO 2002b: 879). O Chalet foi caracterizado por vários autores, entre eles Gervásio Lobato, como um “[…] reles barracão […]” (LOBATO 1889: 10) de madeira que, apesar de não ter grandes condições, deu ao seu proprietário lucros consideráveis.

O proprietário do Chalet acabou por vender os terrenos do “velho” Condes a Francisco de Almeida Grandella, o abastado comerciante e futuro proprietário dos Armazéns Grandella. Após a demolição do barracão de madeira, deu-se início à construção do edifício do Teatro Novo da Rua dos Condes, cujas obras foram financiadas por uma sociedade encabeçada por Grandella e formada por “títulos de dez mil réis, com garantia de entrada por meios preços nos espectáculos, quatro vezes por mez, e amortizáveis cada anno, por sorteio” (Anon. 1889b: 27). Estes títulos, revela-nos Sousa Bastos, eram “amortizáveis em dez annos” (SOUSA BASTOS 1898: 359) e foram pagos atempadamente e na totalidade.

A edificação do novo teatro ficou ao encargo do arquiteto Dias da Silva, que projetou um edifício que ocupava “apenas [uma] área de 32 metros de comprimento e 15 de largura” (ibidem: 461): dimensões significativamente mais reduzidas que o edifício do “velho” Condes, que contava com 34 m de comprimento e 24 de largura ao longo da atual Avenida da Liberdade. Esta redução espacial foi consequência do alargamento da Rua dos Condes, decretado pela Câmara após a destruição do velho pardieiro, em 1882.

Contrariamente ao “velho” Condes, a fachada principal do teatro ganhou nova orientação por questões de reorganização do espaço urbano, uma vez que a Avenida da Liberdade se tornara, entretanto, uma área de importância crescente no tecido urbano e social, pelo que a entrada lateral (a da Rua dos Condes) ficou desde então reservada apenas aos artistas e restantes funcionários do teatro. O público entrava agora por três grandes portas viradas para a Avenida, que se abriam para um vestíbulo através do qual se tinha acesso ao ”espaçoso salão-bufete” (Anon. 1889b: 27) que ocupava todo o piso térreo do teatro e cujo teto fora executado pelo pintor Augusto Gameiro, em estilo árabe. Este mesmo vestíbulo dava, também, acesso à plateia – situada imediatamente acima do botequim – e pisos superiores, por meio de duas largas escadarias.

Relativamente à sala, recordamos a descrição de Sousa Bastos que nos revela que a “[…] platéa é dividida em quatro classes: fauteuils, cadeiras, superior e geral. Junto ao palco há 3 pequeninas frizas de cada lado. Tem duas ordens de camarotes com 21 em cada uma” (SOUSA BASTOS 1898: 359). A decoração desta sala, que ostentava no teto medalhões com retratos de grandes figuras do teatro português (como Garrett ou Emília das Neves), ficou a cargo dos cenógrafos Eduardo Reis e Júlio Machado e foi muito criticada por Sousa Bastos que fez uma apreciação extremamente negativa deste teatro, considerando acanhado o seu palco (SOUSA BASTOS 1898: 359). Contudo, Gervásio Lobato, num tom mais otimista, revela-nos “[…] um theatrinho pequeno, mas muito fresco, muito elegante e muito aceado” (LOBATO 1889: 10), com um interior que correspondia “[…] perfeitamente ao seu aspecto exterior, que produz muito boa impressão e apesar de não ter luxo de architectura, tem uma apparencia sympathica e elegante […]” (ibidem).

Este novo edifício, “[…] garrido, ornado de lucarnas e janelas esguias […]” (Anon. 1888: 2), mas de fachada elegante e com maior comodidade que o “velho” Condes, estava, também, melhor equipado que este último na eventualidade de um incêndio, uma vez que não só possuía corredores mais espaçosos, como havia “[…] uma completa intercepção entre o local destinado ao público e o palco, tornando-se impossível a communicação d’incêndio d’um para outro lado” (Anon. 1889b: 27). O “novo” Condes foi, deste modo, a primeira sala de espetáculos em Portugal a ter um mecanismo corta-fogo.

Os primeiros empresários a explorar o espaço foram Salvador Marques e Casimiro de Almeida. Juntos montaram uma companhia dirigida e ensaiada por Sousa Bastos e composta por Pepa Ruiz, Guilhermina de Macedo, Laura Godinho, Luiza d’Oliveira, Encarnação Reis e Isabel Ficke, bem como por Alfredo Carvalho, Sergio d’Almeida, Roque, Salazar, Mathias d’Almeida, Carlos Rocha, Caetano Reis, Pinheiro, Pereira d’Almeida, Lima e Cruz (Ibidem). Foi esta mesma companhia que, a 23 de dezembro de 1888, inaugurou o espaço. O espetáculo foi composto por uma peça em dois quadros de Baptista Machado, Ontem e hoje, bem como pela opereta em dois atos, As duas rainhas, com tradução de Joaquim Augusto de Oliveira e Sousa Bastos. Estas duas apresentações não foram muito bem recebidas, ao contrário do monólogo de inauguração da sala recitado pelo ator Taborda no início da noite (Ibidem). Os espetáculos que se seguiram foram, tal como o primeiro, recebidos de forma pouco entusiástica pelo público do Condes. Todavia, o vaudeville de Sousa Bastos, O casamento de Nitouche, alcançou um sucesso considerável, trazendo fortes receitas de bilheteira e um aumento de popularidade para a nova sala (Ibidem).

Em 1898 o edifício sofreu obras de remodelação internas, que pouco mais fizeram do que eliminar o botequim do piso térreo, descendo a plateia ao nível da rua. Esta modificação aumentou a lotação da sala ao criar duas novas ordens de balcões abaixo dos já existentes. O palco foi nivelado com a plateia e os camarins, e na cave foram construídos diversos espaços de apoio à realização dos espetáculos. Sousa Bastos, referindo-se a estas alterações ao edifício, confessava que “[…] o theatro ficou um verdadeiro poço, sem comodidades algumas para o público e ainda menos para os artistas. Se era mau, ficou muito peior depois da obra” (SOUSA BASTOS 1908: 359).

Ao longo dos quase 30 anos de atividade teatral, o reportório do “novo” Condes foi maioritariamente composto por teatro de revista e operetas, contando com êxitos como O solar dos Barrigas (1892), O reino da bolha (1897) ou Agulhas e alfinetes (1899). Pelo seu palco passaram grandes nomes como Valle, Chaby, António Pedro ou Ângela Pinto, até que, em janeiro de 1915, devido à diminuição da afluência de público e consequente perda de receita financeira, o Condes deu por terminada a sua existência enquanto teatro para se converter em cinema pela mão do empresário do Olympia, Leopoldo O’Donnell.

A sua estreia como cinema ocorreu a 2 de abril de 1915, com o filme italiano Cleópatra, mas as receitas insatisfatórias levaram O’Donnell a abandonar o projeto. Contudo, José Martins Castello Lopes viu no espaço uma oportunidade a aproveitar e a 5 de fevereiro de 1916 deu início à exploração do espaço pela empresa Castello Lopes, passando, desde então, a utilizar a designação oficial de Cinema Condes. O edifício, construído em 1888, foi, no verão de 1919, alvo de obras que alteraram significativamente o seu interior, aumentando a sua lotação e transformando o ambiente e a disposição da sala (RIBEIRO 1978: 123). Esse mesmo edifício manteve-se no ativo enquanto cinema até 1951, ano da sua demolição, para dar lugar a uma sala construída de raiz – projeto do arquiteto Raul Tojal – especificamente para o efeito. Inaugurado a 30 de outubro de 1951, o Cinema Condes manteve-se como sala de projeção até 1997, ano em que deixou de poder competir com as novas salas de cinema dos centros comerciais. Este edifício – cuja fachada foi embelezada pelos baixos-relevos realizados pelo escultor Aristides Vaz – mantém, ainda hoje, o seu aspeto exterior original, embora tenha sofrido profundas alterações ao nível do seu interior para receber, a partir de 2003, o Hard-Rock Café de Lisboa.

 

Bibliografia

Anon. (1888). s/t in A Comédia Portugueza, 29 dezembro 1888, Lisboa, p.2

___ (1889a). “Pelos palcos” in A Comédia Portugueza, 19 janeiro 1889, Lisboa, p.7.

___ (1889b). “O novo theatro da Rua dos Condes” in O Occidente, nº 364, 1 fevereiro 1889, Lisboa, p.27.

BASTOS, Gloria et. al. (2004). O Teatro em Lisboa no Tempo da Primeira República. Lisboa: IPM.

CÂMARA, João da (1898a). “Chronica Occidental” in O Occidente, nº 710, 20 setembro 1898, Lisboa, p.210.

___ (1898b). “Chronica Occidental” in O Occidente, nº 714, 30 outubro 1898, Lisboa, p.242.

___ (1898c). “Chronica Occidental” in O Occidente, nº 717, 30 novembro 1898, Lisboa, p.265.

CARNEIRO, Luís Soares (2002a). Teatros portugueses de raíz italiana, vol. I. Dissertação de Doutoramento em Arquitetura, apresentada à Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (texto policopiado).

___ (2002b). Teatros portugueses de raíz italiana, vol. II. Dissertação de Doutoramento em Arquitetura, apresentada à Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (texto policopiado).

DIAS, Marina Tavares (1990). Lisboa desaparecida, vol. II. Lisboa: Quimera Editores.

LOBATO, Gervásio (1889). “Chronica Occidental” in O Occidente, nº 362, 11 janeiro 1889, Lisboa, p.10.

MARQUES, Gentil (1952). Álbum de recordações: esta é a história do Cinema Condes. Lisboa: Tip. Grafitécnica.

REBELLO, Luiz Francisco (1978). Dicionário do Teatro Português. Lisboa: Prelo.

RIBEIRO, M. Félix (1978). Os mais antigos cinemas de Lisboa 1896-1939. Lisboa: Instituto Português do Cinema – Cinemateca Nacional.

SOUSA BASTOS, António de (1898). Carteira do Artista. Lisboa: Antiga Casa Bertrand.

___ (1908). Dicionário de teatro português. Lisboa: Imprensa Libânio da Silva.[Uma edição fac-similada do original saiu em 1994 em Coimbra, pela Minerva]. 

 

Consultar a ficha de espaço na CETbase:

http://ww3.fl.ul.pt/cetbase/reports/client/Report.htm?ObjType=Espaco&ObjId=3417

Consultar imagens no OPSIS:

http://opsis.fl.ul.pt/

 

Eunice Azevedo/Centro de Estudos de Teatro