A palavra prosódica é um constituinte prosódico acima da sílaba que também contribui para o ritmo da fala. Este constituinte prosódico é caracterizado por certos aspectos que o relacionam com a ‘palavra’, termo muito genérico que se integra em vários domínios da gramática. Na morfologia, por exemplo, a palavra morfológica é a sequência em que se concretizam certas categorias morfológicas como o número ou a flexão verbal, e tem uma estrutura interna que inclui um radical e, frequentemente, sufixos. Por seu lado, a palavra prosódica integra traços prosódicos como o acento e pode não coincidir com a palavra morfológica.
As palavras prosódicas são caracterizadas pelos seguintes aspectos:
• Uma palavra prosódica tem um único acento principal. Assim, a palavra guarda-chuva é uma palavra morfológica por ser um composto, mas são duas palavras prosódicas porque tem dois acentos. O mesmo se pode dizer de palavras com prefixos acentuados como pré- ou pós-. Vejam-se mais exemplos (o símbolo da palavra prosódica é []).
Palavras morfológicas
Palavras prosódicas
luso-americano
[luso] [americano]
surdo-mudo
[surdo] [mudo]
pré-tónica
[pré] [tónica]
socioeconómico
[socio] [económico]
• Em consequência de terem um único acento, as palavras prosódicas são o domínio de processos fonológicos como o da redução das vogais átonas ou da supressão da vogal . Assim, palavras morfológicas como papelzinho ou secamente, em que não se reduzem as vogais átonas pré-tónicas, são constituídas por duas palavras prosódicas – [papel] [zinho], [seca] [mente].
• Tal como a palavra morfológica pode conter duas prosódicas, também a palavra prosódica pode ser constituída por duas ou mais palavras morfológicas, o que sucede quando há ênclise ou próclise, ou seja,
• numa sequência de duas palavras como disse-lhe, em que a segunda palavra é um pronome átono enclítico;
[disse-lhe]
[ama-me]
[olha-te]
• quando o pronome integra a palavra, no caso de mesóclise, como em dir-lhe-emos, far-te-ei;
• numa sequência de artigo seguido de palavra morfológica como em o menino, em que o artigo está em posição proclítica, isto é, subordinado ao acento da palavra seguinte
[o menino]
[um rapaz]
[a gata]
• No interior de uma palavra prosódica formada por uma forma verbal terminada em , como disse, seguida de um pronome enclítico iniciado por uma vogal (por exemplo disse-a), o pronome integra-se na palavra prosódica e a vogal que termina a forma verbal realiza-se como a semivogal [j]. Vejam-se as seguintes realizações de disse em fala coloquial: disse-a em contraste com disse bem ou disse assim .
Essa vogal final da forma do verbo realiza-se como uma semivogal e forma um ditongo ‘crescente’ com a vogal seguinte , ou seja, a palavra prosódica realiza-se foneticamente como . O mesmo acontece no interior de formas verbais, em casos de mesóclise (por exemplo dir-lhe-emos realiza-se como ).
Como se vê nos exemplos, o bloqueio da supressão da vogal final em formas como disse, (ou bate, ame, fale, diz-me) é consequência da formação de uma só palavra prosódica, e não se dá em outras circunstâncias de sândi externo (isto é, no encontro entre o fim de uma palavra e o início de outra). Veja-se o que se passa quando se trata de duas palavras prosódicas como disse assim ou diz-me amanhã. Nestes casos, a vogal é normalmente suprimida com uma consequente ressilabificação (por exemplo, disse assim , disse agora , diz-me amanhã ).