Adolfo Coelho
Alexandre Herculano
Almeida Garrett
Antero de Quental
António Nobre
Basílio Teles
Eça de Queirós
Gomes Leal
Jaime Batalha Reis
Lopes de Mendonça
Moniz Barreto
Oliveira Martins
Pinheiro Chagas
Rafael Bordalo Pinheiro
Rebello da Silva
Teófilo Braga
Abel Salazar
Adérito Sedas Nunes
Adolfo Casais Monteiro
Agostinho da Silva
Alexandre O'Neill
António Gedeão
Aquilino Ribeiro
Augusto Abelaira
Bento de Jesus Caraça
Bernardo Marques
Borges de Macedo
Carlos Ramos
David Mourão-Ferreira
Eugénio de Andrade
Fernando Gil
Fernando Lopes-Graça
Fernando Pessoa
Fidelino de Figueiredo
Florbela Espanca
Guilhermina Suggia
Helena Vaz da Silva
Hernâni Cidade
Irene Lisboa
Jacinto do Prado Coelho
Jaime Cortesão
João Gaspar Simões
Joaquim de Carvalho
Jorge de Sena
Jorge Peixinho
José Augusto Seabra
José Cardoso Pires
José Gomes Ferreira
José Rodrigues Miguéis
Leonardo Coimbra
Lindley Cintra
Luís Albuquerque
Luís de Freitas Branco
Manuel Antunes
Manuel Viegas Guerreiro
Maria Archer
Maria de Lourdes Belchior
Maria Lamas
Mário Botas
Mário Eloy
Mário Sottomayor Cardia
Miguel Torga
Orlando Ribeiro
Paulo Quintela
Raul Brandão
Raul Proença
Sílvio Lima
Sophia de Mello Breyner Andresen
Teixeira de Pascoaes
Vergílio Ferreira
Viana da Mota
Vieira da Silva
Vieira de Almeida
Vitorino Magalhães Godinho

por Carlos Leone
Borges de Macedo

Fidelino de Sousa Figueiredo (Lisboa, 1888 – Lisboa, 1967)

Fidelino de Figueiredo é há muito um autor esquecido mesmo por aqueles que contactam com a sua imensa Obra. A mais forte das razões para esta situação é a dificuldade em enquadrá-la no seu tempo. Com efeito, nascido no mesmo ano que, por exemplo, Vieira de Almeida, a sua actividade parece anterior (apesar de ter morrido até mais tarde). O que sucede é algo simples de compreender (o próprio Fidelino o observou) mas difícil de contrariar: o seu pensamento e mesmo a sua sensibilidade eram tributários de um século XIX, liberal e selecto, que não chegou a tempo de viver.

Homem de Letras, espírito fino e elevado, o seu tempo não poderia ser o século XX que conheceu em Portugal (e Espanha): o de regimes conflituosos e populares, e depois violentos e anti-liberais. E se começou por fazer nome em sucessivos trabalhos de grande extensão dedicados à crítica literária como ciência (pós-positivista, no entanto) e à História da Literatura Portuguesa, nas décadas de 1910 e 1920, o seu espírito era o de um homem do mundo, mas não exactamente do seu tempo. Isso mesmo era óbvio quando o jovem José Régio, para melhor vincar a genialidade de Pessoa, comparava favoravelmente os breves prefácios deste com as longas obras de Fidelino. E o mesmo se poderia dizer dos géneros mistos (romanescos) que também ensaiou, nos quais o seu estilo sobressaía mas, de igual modo, o seu anacronismo também. Contudo, crescentemente considerado em Espanha, fruto do seu interesse pelos temas iberistas, obteve aí sucesso junto do público e da crítica, bem como de vastos sectores académicos com duas obras: As Duas Espanhas e Pyrene (1932 e 1935, respectivamente). Mas desenvolveu o seu magistério académico não tanto na Península Ibérica quanto nos EUA, México e, sobretudo, Brasil (São Paulo, onde dirigiu a revista Letras e deixou discípulos). Por esta altura, cerca de 1950, mesmo antigos críticos, como o presencista Adolfo Casais Monteiro, já o estimavam quer intelectualmente quer civicamente. Veio a morrer, após longa doença, em Lisboa.

Neste ponto convém observar que a vida de Fidelino de Figueiredo não decorreu apenas entre livros e bibliotecas, embora aí se sentisse em casa. Na verdade, foi político (ministro de Sidónio Pais), duas vezes director da Biblioteca Nacional (a primeira na década de 1910, a segunda na de 1920) e exilado político, fugindo ao desterro para as colónias (após tentar derrubar a ditadura instalada em 1926 num golpe em 1927). Mesmo reiterando o seu desinteresse pela política, nunca abdicou do seu liberalismo, tanto na vida literária como na pública. Foi, por isso, incompreendido tanto pelo regime do Estado Novo como por muitos dos mais novos que se lhe opunham. De certo modo próximo de Ortega y Gasset, só que sem esperança em renovar o liberalismo, que entendia ter sido superado pelo democratismo na Europa pós-Segunda Guerra Mundial, Fidelino desejava que o pós-guerra trouxesse uma governação global mais eficaz que a experiência da Liga das Nações, mas para todos os efeitos nunca foi um pensador político.

Por outro lado, o seu pensamento tem numerosas facetas. O melhor estudo compreensivo de que dispomos, de Mário Carneiro, subdivide-o enquanto Filosofia em Epistemologia, Filosofia da Cultura e Filosofia da Educação, reconhecendo embora como o tempo acrescentou a estas áreas trabalhos de teoria da História, Música, etc. Em rigor, o pensamento de Fidelino é de tal modo diverso que melhor é identificar o que nele falta: ciências sociais. Como os seus estudiosos mais rigorosos notaram, mesmo a Psicologia e a História que encontramos nos seus escritos têm maiores afinidades com o século XIX do que com o XX, e isso deve-se ao modo de pensar, mais do que a falta de conhecimentos.

Leitor incessante, Fidelino correspondeu-se com numerosos estudiosos de muitas origens. Sempre atento aos grandes temas do seu tempo, talvez melhor do que em outros temas seja no pensamento sobre as crises da época em que viveu que melhor se vê a marca original da sua Obra. De facto, Fidelino via o seu tempo como um de crise, mas pela positiva, isto é, como um de «cultura intervalar» (título de um dos seus livros). Entendia por este termo o período de passagem de uma era cultural para outra; assim, a Idade Média (finda logo com Carlos Magno, de resto) teria sido intervalar entre duas eras, e mesmo assim também original em muitas coisas, desde o Direito até aos registos vernaculares entretanto promovidos a línguas de cultura e oficiais. Mesmo hoje é discutível até que ponto tal leitura é rigorosa, mas independentemente de outros aspectos, a sua originalidade é real e merece interesse.

Embora Fidelino nunca tivesse obtido consolo com semelhante singularidade: «roubar a alguem a pátria é talvez o maior crime da malevolência politica, porque é desenquadrar uma vida da moldura social que lhe dá significado e finalidade, é demolir toda a architectura duma vida.» (Notas para um Idearium Português, p. 221). Ele perdera a sua, o liberalismo de Oitocentos.


Referências bibliográficas:

Carneiro, Mário, O Pensamento Filosófico de Fidelino de Figueiredo, INCM, Lisboa, 2004.

Serra, Pedro, Um Intelectual na Fobolândia, Angelus Novus, Coimbra e Braga, 2004.

Lemos e Moreira Leite, orgs, A Missão Portuguesa : Rotas Entrecruzadas, ed. UNESP, S. Paulo, 2002.


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