por Manuel Pedro Ferreira

Jorge Peixinho
Jorge Peixinho (1940-1995) foi um dos mais importantes compositores portugueses do século XX, tendo tido um papel fundamental na actualização do panorama musical do país entre 1961 e meados da década de 1980, não apenas através da sua actividade criativa, mas também enquanto incansável divulgador, ensaísta e intérprete. A sua obra, em que se detecta uma progressiva evolução estilística, conjuga com uma crescente originalidade a flexibilidade da ideia ou da execução musical e o rigor da escrita.

Nasceu no Montijo, onde iniciou os estudos de piano com sua tia Judite Rosado. Estudou Composição no Conservatório Nacional, em Lisboa, com Artur Santos (1948-1954) e Jorge Croner de Vasconcellos (1954-1956). Terminou em 1958 o Curso Superior de Piano no Conservatório Nacional, onde trabalhou com Fernando Laires, tendo também frequentado brevemente a Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Como bolseiro da Fundação Gulbenkian, aperfeiçoou-se em Composição em Roma entre 1959 e 1961 com Boris Porena e Goffredo Petrassi, adoptando então o cromatismo integral e o atonalismo serial como base para a assimilação de novas técnicas criativas. Na Holanda, em 1960, familiarizou-se com as possibilidades oferecidas pelos estúdios de música electrónica. Trabalhou ainda com Luigi Nono em Veneza e com Pierre Boulez e Karlheinz Stockhausen em Basileia, tendo frequentado, na década de1960, os cursos internacionais de composição de Darmstadt, onde participou em obras colectivas orientadas por Stockhausen.

Em Lisboa, Peixinho divulgou, com grande escândalo, a música de John Cage (1961, 1964); dirigiu cursos de música contemporânea em colaboração com Louis Saguer e Pierre Mariettan (1962-1964): desdobrou-se como pianista, crítico musical, conferencista e ensaísta; e participou ainda em estrepitosos "happenings" multi-media (1965, 1967). Em 1970, fundou o influente Grupo de Música Contemporânea de Lisboa, que dirigiu até à sua morte, tendo-se apresentado com ele em diversos países da Europa e da América do Sul; o GMCL abriu uma janela sobre a criação contemporânea internacional e permitiu que nomes como Constança Capdeville e Emmanuel Nunes, entre outros, se fizessem ouvir.

Na obra de Peixinho, a crescente influência de Stockhausen é detectável a partir de 1963, culminando na acentuada componente aleatória de "Eurídice Re-amada" (1968). De 1969 em diante, a música de Peixinho ganhou um lirismo particular, facilmente reconhecível, baseado no entretecer de citações, na distensão temporal e no refinamento tímbrico. No início dos anos oitenta, o compositor passou a privilegiar a falsa citação e a auto-citação e a explorar universos sonoros estilisticamente "impuros", que testemunham a influência pontual da sensibilidade pós-moderna, com a qual teve uma relação ambígua. A sua influência foi grande no meio nacional; compositores como Clotilde Rosa, Paulo Brandão ou Isabel Soveral devem-lhe um impulso decisivo para a sua evolução artística.

Jorge Peixinho recebeu vários prémios nacionais de composição: o Prémio do Conservatório Nacional em 1958, o Sassetti em 1959, o da Casa da Imprensa em 1972, o Gulbenkian em 1974, o da S.P.A. em 1976 (duas categorias), o do Conselho Português da Música em 1984, o da S.P.A. em 1985 (categoria de música de câmara) e, finalmente, o Prémio Joly Braga Santos em 1988. Foi professor no Conservatório de Música do Porto (1965-1966) e na Escola de Música do Conservatório Nacional em Lisboa (1985-1995). Politicamente activo desde finais dos anos sessenta, conotado com uma esquerda próxima do P.C.P. (de 1993 a 1995 chegou a presidir, pela CDU, à Assembleia Municipal do Montijo), soube conjugar na sua obra musical o empenhamento moral e a integridade artística.

Manuel Pedro Ferreira


BIBLIOGRAFIA SELECCIONADA

1) De Jorge Peixinho:

"Música e Notação" (separata de Poesia Experimental-2, Lisboa: Cadernos de Hoje, 1966)

«Canto de amor e de morte. Introdução a um ensaio de interpretação morfológica» in III Ciclo de Cultura Musical: Fernando Lopes-Graça. Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa/ Agência da J.M.P., 1966.

"Música sem fantástico ou música arte-fantástica?", in O Fantástico na Arte Contemporânea, Lisboa: Gulbenkian, 1992, pp. 219-22

«Lopes-Graça: nova luz sobre uma figura ímpar da cultura portuguesa» in Uma homenagem a Fernando Lopes-Graça, Matosinhos, Edições Afrontamento/Câmara Municipal de Matosinhos, 1995, pp. 6-15


2) Sobre Jorge Peixinho:

Mário Vieira de Carvalho, Estes sons, esta linguagem, Lisboa: Estampa, 1978

Sérgio Azevedo, A invenção dos sons. Uma panorâmica da composição em Portugal, hoje, Lisboa: Caminho, 1998

José Machado (coord.), Jorge Peixinho in memoriam, Lisboa: Caminho, 2002

Manuel Pedro Ferreira (coord.), Dez compositores portugueses do século XX, Lisboa: Dom Quixote, 2006

Cristina Teixeira, Música, Estética e Sociedade nos escritos de Jorge Peixinho, Lisboa: Colibri, 2006


DISCOGRAFIA DA OBRA DE PEIXINHO

Música I (Cinco pequenas peças, Collage I, Estudo I, Harmónicos, Sucessões Simétricas I). Jorge Peixinho e Filipe de Sousa, pianos. LP: Tecla, 1972 (reed. CD: Jorsom, 1994)

CDE,. Grupo de Música Contemporânea de Lisboa, dir. Jorge Peixinho. LP: Sassetti, 1974 (reed. CD: Strauss, 1995)

Elegia a Amílcar Cabral, música electrónica. LP: Sassetti, 1978 (reed. CD: Strauss-PortugalSom, 1997)

As Quatro Estações. Grupo de Música Contemporânea de Lisboa, dir. Carlos Franco. LP: Sassetti, 1982 (reed. CD: PortugalSom, 1991)

 Music of Portugal, series of 20 LPs, 2nd subset of 5, LPs 4106, 4109 (inclui Sucessões Simétricas I, Episódios). Fernando Laires, piano; Manhattan String Quartet. Educo (USA), [1984]

Koellreutter (inclui Greetings für Koellreutter), Grupo Juntos Música Nova. LP: Fundação Nacional de Arte/ Memória Musical Brasileira, 1985.

Música Portuguesa Contemporânea – Obras para guitarra  (inclui L'Oiseau-Lyre). José Lopes e Silva. LP: PortugalSom, 1985 (reed. CD, 1995)

Daniel Kientzy (inclui Sax-Blue). Daniel Kientzy, saxofone. LP: Poly, 1988.

Jorge Peixinho: Sobreposições, Políptico 1960, Sucessões Simétricas II, As Quatro Estações. Orquestra Sinfónica de Budapeste/ GMCL. CD: PortugalSom, 1991.

Música Portuguesa Contemporânea – Obras para clarinete (inclui O novo canto da Sibila). António Saiote, clarinete. CD Strauss-PortugalSom, 1995.

Jorge Peixinho: Concerto para saxofone alto e orquestra, Sax-blue, Passage intérieur, Fantasia-Impromptu. Daniel Kientzy, saxofones /Filarmonica Transilvania et al., CD: Nova Musica, 1996

Música Portuguesa – Séc. XX (inclui À flor das águas verdes e Nocturno no Cabo do Mundo), Grupo de Música Vocal Contemporânea, dir. Mário Mateus /Jorge Peixinho, Francisco Monteiro e Jaime Mota, pianos, CD duplo: Numérica, 1996

Lov (inclui Lov II). Trio Lov. CD: AM&M, 2002

Jorge Peixinho – Música para piano. Miguel Borges Coelho, piano. CD duplo: Numérica, 2005

Adolfo Coelho
Alexandre Herculano
Almeida Garrett
Antero de Quental
António Nobre
Basílio Teles
Eça de Queirós
Gomes Leal
Jaime Batalha Reis
Lopes de Mendonça
Moniz Barreto
Oliveira Martins
Pinheiro Chagas
Rafael Bordalo Pinheiro
Rebello da Silva
Teófilo Braga
Abel Salazar
Adérito Sedas Nunes
Adolfo Casais Monteiro
Agostinho da Silva
Alexandre O'Neill
António Gedeão
Aquilino Ribeiro
Augusto Abelaira
Bento de Jesus Caraça
Bernardo Marques
Borges de Macedo
Carlos Ramos
David Mourão-Ferreira
Eugénio de Andrade
Fernando Gil
Fernando Lopes-Graça
Fernando Pessoa
Fidelino de Figueiredo
Florbela Espanca
Guilhermina Suggia
Helena Vaz da Silva
Hernâni Cidade
Irene Lisboa
Jacinto do Prado Coelho
Jaime Cortesão
João Gaspar Simões
Joaquim de Carvalho
Jorge de Sena
Jorge Peixinho
José Augusto Seabra
José Cardoso Pires
José Gomes Ferreira
José Rodrigues Miguéis
Leonardo Coimbra
Lindley Cintra
Luís Albuquerque
Luís de Freitas Branco
Manuel Antunes
Manuel Viegas Guerreiro
Maria Archer
Maria de Lourdes Belchior
Maria Lamas
Mário Botas
Mário Eloy
Mário Sottomayor Cardia
Miguel Torga
Orlando Ribeiro
Paulo Quintela
Raul Brandão
Raul Proença
Sílvio Lima
Sophia de Mello Breyner Andresen
Teixeira de Pascoaes
Vergílio Ferreira
Viana da Mota
Vieira da Silva
Vieira de Almeida
Vitorino Magalhães Godinho

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